É muito difícil se desfazer de um brinquedo, apesar de tantos conselhos e advertências. Há muita desculpa para sustentar a teimosia, além de choros e uma certa agressividade. E é isso que se observa em muita gente que se apega, de maneira doentia, aos chamados "médiuns espíritas", principalmente se for o principal deles, Francisco Cândido Xavier.
As esquerdas sentem complacência por ele, influenciadas por uma imagem "agradável" que envolve clichês de "bondade humana" dos mais diversos. Só que essa imagem é idealizada, adocicada, e nem de longe corresponde à imagem do reacionário ranzinza que se revelou no programa Pinga Fogo, da TV Tupi, de 1971.
A imagem apresenta aspectos fantasiosos, estimulando uma emotividade exagerada e cega, transformando Chico Xavier num ídolo religioso ao qual se presta adoração extrema, mas também mórbida e submissa, da qual não se motiva por razões lógicas, mas pelo subjetivismo igrejeiro das velhas beatitudes, frutos do apego extremado às paixões religiosas que prevalece no Brasil.
Para defender essa idolatria, que traz sensações de catarse que combinam êxtase emocional (a "masturbação com os olhos" das comoções religiosas, sobretudo pela diversão às custas da tragédia alheia estimuladas pelos eventos "espíritas"), as esquerdas chegam a fazer uma ginástica mental, tentando fazer argumentos sem sentido, mas bastante verossímeis e persistentes. Vamos à seleção de algum deles.
"Vocês falam para as esquerdas se desapegarem de Chico Xavier, quando temos que nos unir independente de ideologias para promover a paz e a fraternidade nesses tempos de explosão do ódio?"
O grande problema é que essa "linda argumentação" traz um velho vício, o de ver a "paz" sob o prisma das paixões religiosas, tornando o pacifismo refém de uma idolatria religiosa. Além disso, Chico Xavier criou as condições psicológicas, com seu moralismo retrógrado, da explosão de ódio que aqui temos, pois seu ideal "pacifista" se fundamentava em pedir para os oprimidos sofrerem calados e perdoarem os opressores nos seus abusos e privilégios extremos.
Um dia a panela de pressão explode, porque esse apelo, ao sufocar o oprimido pela dor e consentir com os abusos do opressor - sob o pretexto de que Deus irá, "um dia, resolver a situação" - , faz com que ódios de ambos os lados se explodam, porque um dia não vai dar para controlar as emoções diante do acúmulo de adversidades sofridas pelos oprimidos e da instabilidade dos privilégios rotineiros dos opressores.
Chico Xavier só promovia a "paz" e a "fraternidade" sob esse enfoque conservador. Uma "paz" castradora, mais submissa e condescendente com as injustiças que finge combater com ações paliativas que, sem trazer a verdadeira qualidade de vida, apenas evita os efeitos extremos da miséria, mais para evitar rebeliões populares do que para auxiliar realmente os mais necessitados.
"Acho equivocada sua visão porque, pela vida que Chico Xavier viveu em favor do próximo, creio que ele era socialista, sim".
Mais um pensamento desejoso motivado pela fascinação obsessiva, pelas paixões religiosas. Uma ideia vaga, sem pé nem cabeça, mas que vale como "verdade absoluta" por conta dos aspectos agradáveis.
Não há provas dessa "caridade" de Chico Xavier, muito mais um dogma religioso do que uma realidade. Afinal, se essa "caridade" funcionasse e viesse dos recursos trazidos por ele - a ajuda só vem de terceiros, ele apenas se promove como um pavão às custas dos joões-de-barro - , o Brasil seria um dos países mais desenvolvidos do mundo e Uberaba estaria entre as dez cidades de maior qualidade de vida do mundo.
"Chico Xavier está acima das ideologias, ele é um médium acima da média e acima da mídia. O partido dele é a Paz".
Outra bela falácia, motivada pelas paixões religiosas de sempre. Ela não fala coisa alguma sobre a realidade, sendo submetida a ver a mitologia acima da realidade. São relatos puramente emocionais que não trazem um sentido lógico e escondem a verdadeira realidade: Chico Xavier era um sujeito conservador por toda a vida e foi blindado pela mídia hegemônica (TV Tupi e, nos últimos 40 anos, Rede Globo), portanto estando ligado a uma ideologia e um poder midiático dominantes.
Quanto à "paz", vale o argumento acima da "paz sem voz" que aconselha aos oprimidos sofrerem em silêncio as adversidades sem fim e perdoar os opressores nos seus privilégios e ações abusivos, sob a desculpa de que "Deus resolverá essas injustiças um dia". Portanto, não há como falar em "paz" dessa forma tão catártica e apaixonada, porém vazia e emocionalmente bastante perigosa, podendo levar à irritação diante do menor questionamento e, daí, para romper a "paz" que reina feliz no discurso.
"Não vejo problema em ser esquerdista e apoiar Chico Xavier, pelas coisas boas que ele trouxe para nós".
Outra falácia. Pois o problema do progressista em geral (seja ele ateu, seja um esquerdista ou um outro tipo semelhante) é esse: endeusar um ídolo religioso conservador, que além disso é um traidor da causa espírita. Isso traz azar e progressistas como Juscelino Kubitschek e Dilma Rousseff tiveram infortúnios pesados e sem controle. Recentemente, foi Ricardo Kotscho manifestar "muita saudade" de Chico Xavier para ele ser demitido do portal R7, que abrigava seu blog.
Chico Xavier era uma figura conservadora das piores, e suas energias se tornam melhores quando as personalidades são conservadoras, como Fernando Collor e, mais recentemente, Jair Bolsonaro, que hoje é comparado ao "médium" em um número imenso de aspectos, e que parece aproveitar melhor, mais do que qualquer esquerdista, as vibrações do "médium" cujo reacionarismo se mostrou notório no Pinga Fogo da TV Tupi, em 1971.
Ninguém fica idealizando a atriz Regina Duarte, que fez especiais e minisséries feministas na Globo, tentando ignorar seu apoio explícito a Jair Bolsonaro e o reacionarismo que ela expressa desde 2002. Bonita, carismática, tão cativante que ganhou o título de "namoradinha do Brasil", ela no entanto é reconhecida pelos esquerdistas como uma reacionária contumaz.
Então, por que as esquerdas têm que idealizar Chico Xavier, moldando-o conforme seu pensamento desejoso a partir de fantasias religiosas, se ele nem atrativos têm para isso? O ultraconservadorismo dele saltava nos olhos, ele apenas é que dava um verniz de pretensa beleza às ideias retrógradas que ele defendia.
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