
EDUARDO BOLSONARO, MILITANTE FASCISTA E FILHO DO PRESIDENTE JAIR BOLSONARO, FAZENDO CHACOTA COM A SIGLA LGBT.
Somos oito ou oitenta. Ou teremos que aderir a um reacionarismo acima de limites, ou teremos que adotar um otimismo fantasioso do nada. Se nos ferirmos gravemente e sentirmos dor, em vez de gemermos naturalmente, teremos que gritar "Graças a Deus! Muito obrigado pela desgraça obtida!".
As pessoas fogem de páginas realistas na Internet por um dos dois motivos: um, porque afronta valores estabelecidos na nossa sociedade que, mesmo decadentes, precisam, segundo muitos, ser mantidos. Outro, porque parece contrariar as sensações de otimismo surreal que outra parcela da sociedade defende.
O Brasil se afunda num atraso e em retrocessos galopantes que, de retrocesso em retrocesso, até o que parecia antes uma vantagem banal soa um privilégio, e um pequenino progresso já é considerado uma revolução. Na cegueira extrema de nosso país, até mesmo a miopia soa como uma visão plena, e acreditar em contos de fadas soa lúcido e realista diante das profundezas trevosas dos tempos atuais.
As pessoas não querem melhoria de vida, mas apenas a estabilidade de uma rotina medíocre na qual vivem, porque acham que "dá para viver assim". O Brasil virou a terra do medo, que faz niilistas aderirem à extrema-direita enquanto progressistas aderem ao obscurantismo religioso, achando que apenas rezar Pais-Nossos e Aves-Marias irá devolver o governo da nossa República a Luís Inácio Lula da Silva.
Vivemos esse clima das pessoas de uma cidade caipira, ao saberem que um furacão devastador está se aproximando, estão colocando placas de avisos para dizer para o furacão se afastar desse município. As placas reacionárias avisam: "Se você entrar aqui, furacão, leva chumbo! Ninguém aqui tem medo não!". As mais boazinhas dizem: "Aqui só tem gente de bem e com esperança. Deus não vai deixar que uma força negativa vá nos destruir".
Os efeitos colaterais de um forçado apego a paradigmas que perdem sentido, como no Brasil do governo Ernesto Geisel (1974-1979), que, comentam muitos, foi o período em que os brasileiros atingiram um "nível ideal", uma espécie de resposta "gente como a gente" dos "Anos Dourados" do governo de Juscelino Kubitschek.
Enquanto estávamos em 1979, era normal defender um padrão de retrocessos e perdas dentro de um patamar razoável de sobrevivência, no qual admitimos que um elenco de entes queridos e famosos admiráveis possa ceifar suas vidas precocemente, por acharmos que suas contribuições não iriam mesmo adiante, naquele cenário. Os sonhos da juventude se dissolviam facilmente e com a comodidade de pessoas resignadas com a ideia de que o presente tem que ser ruim e o futuro seja melhor, desde que não se torne esse futuro um presente.
Isso é um absurdo, mas era compreensível em 1974, 1979. Mas os brasileiros insistiram em defender tudo isso nos anos 1980, 1990, 2000 e 2010. Não sabemos se essa ladainha continuará em 2020, mas já está ficando patética essa obsessão de defender o Brasil de Geisel, um padrão medíocre de sociedade que "dá para viver". Daí que essa defesa, que fazia as pessoas se comportassem com normalidade e lucidez há 40 anos, as faz se tornarem psicóticas ou esquizofrênicas hoje.
Chegamos ao ponto de muitos preferirem que morresse prematuramente um cientista que ainda mantém em andamento uma pesquisa de cura para o câncer, do que o falecimento repentino de um rico feminicida que fumou demais, usou cocaína, tomou remédios pesados e se embriagou, mas que "tem que ter vida longa de qualquer jeito" a ponto de se inventar que ele virará youtuber aos 80 anos, como se tivesse forças, físicas e psicológicas, para encarar haters e aceitar dislikes nas suas postagens digitais.
Daí a situação surreal. Talvez muitos brasileiros moralistas aceitem que artistas performáticos de vanguarda falecessem prematuramente, porque a encenação deve ser para o feminicida rico e elegante (mesmo já um coroa ou velho), que foi muito brutal na hora de matar sua mulher, mas banca o tristinho nos tribunais e posa de simpático na hora de deixar a prisão. Esse sujeito "não pode morrer", mesmo que morresse de fato. Se morrer, a imprensa não noticia. O obituário do Wikipedia precisa ser "fofo", como uma lista do Prêmio Nobel. Para muitos, a Morte escolhe caráter, sim.
O que era realista em 1979, virou surreal em 2019. E é por isso que, no ano passado, as pessoas lutaram para um "governo Geisel 2.0" através de Jair Bolsonaro. Ficam enlouquecidas mantendo um modelo de sociedade que não faz sentido. Tiveram um estado de choque quando Lula assumiu o poder com um projeto progressista que a chamada "sociedade do bem" acreditava ter sido obsoleto desde 1964.
Por sorte, a sociedade reacionária tinha um aparelhamento intelectual para defender, pelo menos, a decadência cultural, através dos ritmos musicais popularescos, da imprensa marrom, das sub-celebridades e do falso feminismo das mulheres-objetos. Uma espetacularização da pobreza, da prostituição, do subemprego, das moradias precárias, da ignorância humana, da assimilação de valores retrógrados, como o machismo, nas classes pobres. Tudo isso num combo "brega" servido para setores intelectualizados da nossa sociedade.
Que isso até fosse feito nos quintais da mídia hegemônica, que estava esculhambando Lula, era compreensível. O problema é que esse aparelhamento intelectual que defendia um Brasil mais brega, aproveitando o alto prestígio que tinham para fabricar consenso para suas ideias obscurantistas, foram "vender seu peixe" para a imprensa progressista, alinhada à esquerda, que caiu no conto do vigário e foi defender a cultura brega como se fosse uma "rebelião popular socialista e libertária".
Ah, e tinha o "espiritismo" brasileiro, que, afastado a mil anos-luz dos ensinamentos lógicos de Allan Kardec, tornou-se uma religião não só ultraconservadora, mas medieval. Por sorte, sua embalagem que imita o Espiritismo original engana a todos, e quase ninguém sabe que leva gato por lebre, acolhendo um Catolicismo medieval repaginado sob o rótulo da "Doutrina Espírita", iludidos com o canto de sereia de Francisco Cândido Xavier, vulgo Chico Xavier, que no seu auge vestiu o traje espetacular de ternos brancos bregas, peruca cafona e óculos escuros.
E aí até esse "espiritismo" brasileiro que parece querer colocar o Brasil nos padrões religiosos do século XII - mas tudo sob um verniz tão adocicado que lembra contos de fadas infantis - foi empurrado para as esquerdas ingênuas e complacentes, que enganosamente acolheram qualquer discurso que lhes soasse "positivo", sem saber das armadilhas em que caíram.
AS ESQUERDAS DEIXARAM O GOLPE ACONTECER
Com o acolhimento de paradigmas culturais da direita, que, supostamente, apresentavam uma imagem "positiva" e "alegre" do povo pobre - seja o entretenimento libertino do "funk", seja a mistificação messiânica dos "espíritas" - , as esquerdas, sem saber, foram lesadas e enganadas.
Alegações como "promover o fim do preconceito" e "estabelecer a esperança no futuro" fizeram com que as forças progressistas se iludirem com valores que a direita ofereceu para a contemplação esquerdista, usando ainda como pretextos o "fim da polarização" e a "superação de ideologias".
Ninguém tem dúvida que polarização e ideologismo fazem mal, mas também devemos tomar muito cuidado com pretensos defensores da anti-polarização, que adotam um discurso macio, verdadeiras raposas que prometem se confraternizar com as galinhas, com um discurso tão envolvente que ele se torna uma aparente unanimidade.
E aí vemos o quanto as esquerdas, só muito tardiamente, passaram a hostilizar Tábata Amaral. Mas quantas Tábatas Amaral não apareceram antes e foram acolhidas bovinamente pelas forças progressistas, até com teimosa convicção e com reações irritadas a questionamentos?
"Médiuns" do suposto "espiritismo" brasileiro, funkeiros, jogadores de futebol "pegadores de mulheres" num entretenimento machista que combina carrões, cervejas e mulheres bonitas, cantores bregas, duplas "sertanejas", tabloides de noticiário sensacionalista, tudo isso equivaleu às Tábatas que invadiram o imaginário das esquerdas, um Cavalo de Troia que entrou nas forças progressistas sem que uma Cassandra de Troia fosse ouvida, mas, pelo contrário, antes fosse xingada de "elitista", "preconceituosa" e até (erroneamente) de "higienista".
O culturalismo conservador que isso representou foi acolhido pelas esquerdas devido à utopia e um aparato de um discurso que não tinha a virulência habitual do discurso direitista dominante, e por isso fez as esquerdas acolherem passivamente seus paradigmas acreditando que eles eram "positivos" e "unificadores", por acreditarem nessa retórica que lhes parecia simpática, esperançosa e alegre.
Esquecem que um Luciano Huck é capaz de falar do mesmo jeito e ele nunca foi alguém confiável para as esquerdas. Mas estas acreditaram naquele jornalista cultural que dizia que "a bregalização iria salvar o país". Acreditaram no funkeiro que falava que "era lindo morar em favela", no velho ídolo brega que pregava que "o alcoolismo é o remédio para a tristeza", na mídia sensacionalista que vendia como "jornalismo investigativo" bobagens como "mulher traída corta o bilau do marido", e no "médium" que dizia que "sofrer calado é uma prece que chega mais rápido a Deus".
Resultado? Com essa emotividade anestesiante, as esquerdas acreditaram que esse culturalismo conservador, apenas por apresentar um discurso sem virulência, iria assegurar o caminho das forças progressistas. Mas esse culturalismo permitiu desnortear corações e mentes, deixando as forças progressistas submissas e vulneráveis, acolhendo o golpe político que veio "facim, facim" em 2016.
Muitas fontes, na tentativa de quebrar o falso consenso alucinógeno que, às vezes, as esquerdas possuem no seu imaginário, começam a dizer que foi uma farsa o "baile funk" que a Furacão 2000 armou numa falsa aliança com o Partido dos Trabalhadores, em 17 de abril de 2016.
Aquele evento foi uma armadilha que o rico empresário Rômulo Costa, aliado de políticos empenhados com o golpe contra Dilma Rousseff, armou para diminuir o tom de indignação dos protestos contra a abertura do impeachment. Assim, com as esquerdas distraídas, brincando e dançando o "funk", o protesto era minimizado e haveria um clima mais tranquilo para a realização do golpe político que continua até hoje.
Atualmente, vemos que o governo Jair Bolsonaro, apesar de todos os escândalos, mantém-se em pé. Os escândalos e conflitos só aumentam, mas as esquerdas, algumas, esclarecidas, se esforçando em contestar tardiamente o cenário que não impediram de surgir, e outras, alucinadas, sem entender a gravidade do processo, não se mobilizam para dar fim a esse golpismo sem controle.
E quanto muitos esperam que Jair Bolsonaro está prestes a esvaziar suas gavetas e sair do Palácio do Planalto, eis que seu filho mais articulado, Eduardo Bolsonaro, deputado pelo PSL paulista (numa ação estratégica de usar um domicílio político diferente do pai e dos dois irmãos, Carlos e Flávio, que é o Rio de Janeiro), é escolhido líder do partido na Câmara dos Deputados.
Eduardo Bolsonaro fala de igual para igual com Steve Bannon, o empresário que se tornou o marqueteiro de Donald Trump. Além disso, Eduardo é cotado para ser embaixador do Brasil nos EUA, é líder de um movimento ultraconservador, em cuja reunião recente mostrou uma camiseta fazendo uma galhofa com a causa LGBT, na qual ele substituiu seu significado original pelas expressões Liberty (alusão à Estátua da Liberdade, símbolo dos EUA), Guns (defesa do rearmamento dos cidadãos comuns), Bolsonaro (por razões óbvias) e Trump (o amado governante dos EUA).
As esquerdas continuam no seu transe emotivo, como numa manifestação Lula Livre ocorrida em São Paulo no último domingo. Admite-se que nem as lideranças do PT sentem esse otimismo sonhador que as plateias em transe emotivo profundo porque elas têm uma prática orgânica enfrentando o Legislativo e o Judiciário e sabem das derrotas que sofrem diante do golpismo vigente.
As esquerdas emotivas é que ignoram isso. Elas preferem acreditar que sonhando se vai realizar alguma coisa. "A gente vai revolucionar pela alegria do 'funk', pela paz do Chico Xavier, pela positividade de nos darmos as mãos e crer num futuro melhor". Algo como as galinhas dizerem: "A raposa é graciosa e sorridente, logo ela é das nossas".
Ignora-se que o "funk" é apoiado pelas Organizações Globo e tem em Luciano Huck seu divulgador maior. Se o "funk" é popular, agradeçam ao marido da Angélica Ksyvickis. E Chico Xavier, idolatrado pelo mesmo Huck (coincidência?), defendia ideias retrógradas - a de "aceitar calado o sofrimento e a desgraça e esperar rezando o socorro de Deus" - , apoiou a ditadura militar e até o AI-5 e foi um anti-petista convicto. As esquerdas menosprezam essa realidade.
E é por isso que, acolhendo esse culturalismo conservador da direita, as esquerdas, iludidas por mil pretextos, como o cego acolhimento à anti-polarização que mais parece a união da raposa com as galinhas. E isso num padrão de mediocridade que faz as esquerdas se resignarem com sua situação inferiorizada na Era Geisel, apenas pedindo uma "fatia do bolo" das direitas culturais.
Enquanto esquerdistas tolos acham que Divaldo Franco e Valesca Popozuda decidam, juntos, visitar Lula na prisão e, com a "obsessão do bem" do "médium" e o rebolado da funkeira, forçassem os carcereiros a libertarem o ex-presidente para os dois levarem para o Planalto, o golpe político continua, com Olavo de Carvalho pedindo novo AI-5 e Eduardo Bolsonaro se configurando como um perigoso líder fascista em ascensão. É hora das esquerdas pararem de ter tanta fantasia.
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