
MAIS SAUDÁVEL QUE O FEMINICIDA PIMENTA NEVES (E), PAULO HENRIQUE AMORIM, QUE ERA GENTE BOA E HUMANISTA, MORREU DE INFARTO. PIMENTA, APARENTEMENTE, CONTINUA VIVO.
São coisas surreais. A título de comparação, colocamos uma foto de Paulo Henrique Amorim, que, aos 77 anos, morreu de infarto há poucos meses, e outro jornalista, Antônio Marcos Pimenta Neves, com 82 anos de nascimento, aparentemente vivo mesmo quando, numa das poucas brechas da imprensa, o portal IG noticiou que estava doente há cerca de seis anos atrás.
Pimenta Neves é conhecido por ter matado a colega Sandra Gomide, num famoso caso de feminicídio em agosto de 2000. Pimenta editava O Estado de São Paulo, e Sandra foi sua colega e namorada. Ele a matou com dois tiros num haras em Ibiúna, interior paulista, por não aceitar o fim do namoro. Em seguida, Pimenta ingeriu uma overdose de comprimidos, mas sobreviveu.
Por volta de 2013, o portal IG noticiou que Pimenta Neves estava diabético, num estágio elevado que, segundo a matéria, o deixou quase cego. Pimenta também tinha indícios de câncer na próstata. A matéria só não informou um outro problema provável, que seria uma possível falência de órgãos por consequência da overdose de remédios numa pessoa considerada idosa. E, além disso, Pimenta Neves fumava cigarro socialmente, como a maioria das pessoas de sua geração.
O caso Pimenta Neves não é o primeiro envolvendo feminicidas moribundos que "não podem morrer". O caso de Raul Fernando do Amaral Street, o Doca Street, assassino da namorada Ângela Diniz no final de 1976, em Búzios - por ironia, vizinha de Casimiro de Abreu, terra natal do homônimo poeta ultrarromântico antagônico aos machistas - , é ainda uma comédia surreal de fazer Luís Buñuel ficar abismado.
Primeiro, porque, em 1977, segundo reportagens da revista Manchete, o próprio Doca e os amigos dele estavam preocupados com o tabagismo intenso. Até então, Doca também se embriagava nas festas dos ricaços e usava cocaína, o que fazia muita gente preocupada com sua saúde. Muitos temiam pela morte dele em poucos anos. Até que, com os anos, tudo mudou.
Em tempos de fake news e noticiário tendencioso, Doca passou a ter uma imagem "mais saudável" pela cobertura midiática. Apesar de, levando em conta os efeitos da Natureza no corpo humano, Doca estar seriamente doente desde 1985, com possíveis primeiros efeitos de um câncer que, em suas condições, era potencialmente devastador, tornou-se um tabu por se tratar de um machista que matou a namorada (ou esposa, segundo certas fontes) pela "legítima defesa da honra".
Sim, é surreal. Todos morremos um dia, mas a tragédia humana é um tabu para homens que mataram suas mulheres. Eles "não" podem morrer. Se morrem, a imprensa não noticia, o Wikipedia ignora e, se algum bem informado colocar a data de óbito do de cujus feminicida, os editores do Wikipedia apagam e bloqueiam a página para futuras edições.
Num país em que o obituário tem que parecer "fofinho" como uma lista do Prêmio Nobel, como se a Morte escolhesse caráter para ceifar as vidas das pessoas, é preocupante a atitude de um portal tipo Mídia Independente que, em "vésperas" do bolsonarismo, foi capaz de definir como "preconceituoso" um texto que informava que Doca Street poderia estar com câncer em 2014.
São informações baseadas na Natureza. O cara fumou demais na juventude - e continuou fumando depois de então - , no passado consumindo cocaína e enchendo a cara, consumindo as mesmas drogas que mataram um sem-número de personalidades em evidência nos anos 1970, e não se pode informar que ele está doente, moribundo, estando, a essas alturas, com 85 anos, idade em que Cauby Peixoto, mais saudável, encerrou sua vida.
No caso de Pimenta Neves, a comparação com Paulo Henrique Amorim é surreal. Como é surreal o fato de um sem-número de pessoas que morreram mais cedo por conta de um uso moderado de cigarro ou de um passado já superado de drogas e álcool não encontrar equivalente com homens que assassinam esposas, namoradas, amigas, colegas de trabalho ou de escola, e que sofrem pressões emocionais intensas, que podem fazer um feminicida cair morto na rua, em qualquer momento.
Os feminicidas estão, no Brasil, entre os que mais sofrem riscos de mortes prematuras. Sua expectativa de vida não vai além de 80% do brasileiro comum, o que significa que a expectativa de um feminicida não é viver mais que 60 anos de idade. Um feminicida que vive 85 anos é como um brasileiro comum vivendo 105 anos. Males como infarto, AVC, câncer, mal súbito e acidentes de trânsito são riscos elevadamente potenciais em feminicidas.
HERODES MANDOU MATAR OS "FILHOS". FEMINICIDAS MATAM AS "MÃES"
A aberrante ojeriza da mídia e da sociedade conservadora - que se revolta quando é informada de um feminicida ir a um hospital devido a um AVC ou infarto - , que pela overdose de WhatsApp e Facebook no uso compulsivo de celular criam uma realidade paralela na qual as pessoas passam a se revoltar contra a lógica da realidade e, conforme o caso, brigar furiosamente contra os fatos, permite essa realidade surreal e estúpida do feminicídio, que no Brasil ocorre em doses industriais.
Não se noticia as mortes de antigos feminicidas que atuaram entre 1977 e 2010. Estima-se que, entre os que não se suicidaram após o crime, cerca de 20% dos feminicidas desse período já morreu de "causas naturais" ou de acidentes diversos. Mas a imprensa não publica um parágrafo sequer e muitos feminicidas que "ainda estão vivos e muito bem de saúde" oficialmente hoje são cadáveres reduzidos a pó ou perecendo debaixo do caixão.
E qual a razão dessa omissão? Por que os obituários publicados no Brasil têm que ser fofos, uma lista que só pode ter gente legal, ou gente não tão legal mas meramente mediana? Por que o obituário do Wikipedia tem que parecer a lista do Prêmio Nobel? A Morte escolhe caráter para ceifar vidas?
Se entendermos de forma semiológica, há uma simbologia dessa omissão da tragédia. De dez em dez anos, mais ou menos em ano com final "5", fala-se de informação "recente" sobre Doca Street, como se ele estivesse "muito bem", para a felicidade dos machistas.
Em 1985, Doca "estava escrevendo livro". Em 1995, "feliz com a proximidade da prescrição do seu crime". Em 2005, "finalizava o livro" e no ano seguinte dava entrevistas vendendo a imagem de "bom velhinho", como lhe acusavam os familiares de Ângela Diniz. E, em 2015, na onda das fake news, inventou-se que Doca Street, aos 80 anos, estava "muito ativo nas redes sociais", ignorando que, a essas alturas, ele não tinha mais força física nem psicológica para encarar haters nas redes sociais. Se até Whindersson Nunes se sente abalado com haters...
O que vamos esperar, então, no caso dos 50 anos de morte de Ângela Diniz? Que Doca vai correr a São Silvestre e se tornar, provavelmente, o primeiro brasileiro a ganhar a corrida, depois de tantos anos com vencedores africanos? Doca vai virar o "vovô fitness" de 2025-2026, mesmo quando as forças biológicas se esgotarem antes, como ditam as leis da Natureza e dos descuidos à saúde que abreviam a vida de qualquer um, podendo ser um ator de teatro ou um feminicida?
O problema é que a sociedade conservadora, embora hostilizasse os feminicidas, os trata como se fossem "males necessários", pelo mito de que no Brasil "tem mulher demais" na população. Daí a lógica perversa do "método herodiano" de controle populacional, através de um "genocídio a varejo".
Registra o texto bíblico que o tirano Herodes, rei da Judeia - que em seu currículo incluiu assassinatos de familiares, inclusive sua mulher - , que viveu 69 anos de idade, resolveu o controle populacional ordenando o assassinato de bebês, embora se acreditasse que o motivo seria evitar que surgisse um mensageiro previsto por profetas da época, dos quais se crê, também, ter aparecido Jesus de Nazaré.
Herodes era brutal como os aristocratas do Império Romano, e a lógica era controlar a população matando bebês. E no Brasil dotado de atraso e muita barbárie, e ainda dominado por um moralismo medieval que domina as redes sociais e inspira muito "intelectual de Facebook" a falar besteira travestida de "textos imparciais", a lógica "herodiana" se antecipa pelo controle populacional perverso que elimina mulheres.
Primeiro, cria-se uma "cultura" na qual os casais que se formam não devem ter afinidade pessoal. Cria-se um preconceito contra casais afins, que são vistos como "grudes" e tratados com muita estranheza pela sociedade. Casais sem afinidade, no entanto, são glorificados, pela utopia da "superação das diferenças" e pela atitude "gente como a gente" que não passa de desculpa para naturalizar a sordidez humana.
Segundo, com as divergências conjugais, os "homens de bem" - eufemismo para gente reacionária e vingativa - , alegando-se "vítimas de traição" (quando um simples e educado pedido de divórcio de uma mulher é visto como "traição imperdoável" pelo seu possessivo marido), se vingam matando as mulheres, prejudicando não só a vida das mulheres em geral, como a de outros homens, que perdem aquelas que poderiam ser suas novas namoradas.
O feminicídio acaba se tornando uma prática higienista, de "limpeza do excesso de mulheres" na população brasileira e na "prevenção de superpopulação" evitando o nascimento de novos filhos. E a omissão das mortes dos antigos feminicidas é um meio da sociedade retrógrada evitar que futuros feminicidas se assustem com o alto risco de morrerem cedo com as consequências drásticas dos crimes cometidos.
Quando falamos que um feminicida constrói sua tragédia contra si, nos baseamos em fatos. Não se faz calúnias nem difamações de toda espécie. Se feminicidas apresentam pontos vulneráveis - já houve gente que viu o ex-promotor Igor Ferreira da Silva, quando foragido após mandar matar a esposa Patrícia Aggio Longo, em 1998, em estado debilitado com estranhos sinais de magreza extrema - , só temos que alertar para suas tragédias iminentes, que não podem ser culpa de nós, que escrevemos isso, mas dos excessos que os próprios feminicidas cometem contra si.
As pessoas tratam os feminicidas como aqueles entulhos do porão da casa de alguém, que nunca são usados, são jogados ao esquecimento e acumulam poeira e fungos, mas, quando se fala em se livrar de tais bens, os moradores se revoltam e se irritam profundamente.
A sociedade se irrita quando se fala que um feminicida está muito doente, mas, com base na Biologia, podemos considerar, por exemplo, que Doca Street, pelo seus danos à sua saúde, acumulou para si câncer, mal de Alzheimer (que ele definiu pelo eufemismo de "dislexia", em entrevista em 2006), problemas cardíacos, pulmonares e renais (ele doou, sem sucesso, um rim para um sobrinho que morreu). Não inventamos isso, isso se baseia em ocorrências e potenciais consequências.
Também morre quem atira. A Morte não escolhe caráter. Os feminicidas sofrem intensas pressões emocionais, sofrendo de depressão à ansiedade, sendo movidos por um transtorno bipolar muito perigoso, que pode conduzi-los tanto a um infarto quanto a males súbitos, muitas vezes antes de chegar à velhice.
Se a sociedade se irrita ao ser informada que um feminicida está doente ou pode morrer cedo, então é bom essa sociedade iniciar um tratamento psiquiátrico. E nossa imprensa, pela missão de informação, deveria noticiar mesmo a morte de um feminicida famoso, em vez de omiti-la para evitar uma suposta glamourização do criminoso.
Paciência. Temos que publicar a tragédia de quem quer que seja, para que se possa reconhecer que a Morte não mede caráter para ceifar as vidas das pessoas. Não serão os feminicidas os "super-homens" a evitar os efeitos naturais dos imensos descuidos dados à sua saúde e das fortes tensões emocionais causadas pelos crimes cometidos.
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