Temos uma elite que recuperou seu protagonismo esbanjando hipocrisia. Essa elite, "generosa", "cosciente" e "espiritualista" que agora atua apoiando Lula, sabemos que é a mesma elite de outros golpes políticos - golpe de 1964, AI-5 golpe de 2016, eleição de Jair Bolsonaro - , mas que se repaginou na embalagem e resolveu agora "pregar o amor" através do apoio, incondicional e acrítico, ao presidente Lula.
Eu votei em Lula e me decepcionei porque ele não se concentrou no principal: priorizar as classes trabalhadoras e cuidar do Brasil na reconstrução que permitisse qualidade de vida e combate à miséria e à desigualdade. Nesse sentido, as realizações se reduziram, na prática, a paliativos, sem resultados concretos e práticos.
Pouco importam os discursos de Lula, os relatórios do governo, os comentários e opiniões do presidente. A tal reconstrução do Brasil não aconteceu para valer. A gente não quer relatórios, discursos, simulacros de realizações. Não queremos ouvir criança pobre gritando que o preço da picanha "baixou" ou uma catadora de papel agradecendo ao Lula o atendimento a suas reivindicações pessoais.
Só que as redes sociais, o senso comum, o entretenimento, o mercado de trabalho e o sistema de valores está nas mãos de uma elite que finge ser generosa. Uma elite que, no emprego, só pensa em gente talentosa quando suas empresas estão em falência ou quando seus donos são pessoas arrivistas, querendo obter uma vantagem pessoal através de algum funcionário bastante talentoso.
Não fosse assim, o mercado de trabalho, mais sério, prefere contratar gente medíocre, mais interessada em seguir as convenções sociais ou em interagir com os colegas, dentro de ambientes profissionais tóxicos. Aliás, essa elite "generosa" é bastante tóxica, já se fala que, com Lula, o Brasil entrou na era da positividade tóxica.
Por isso mesmo, o astral dos tempos atuais é uma forma egoísta de curtição sem limites. Não se pode descansar nos fins de semana: tem que se seguir o "compromisso social" de frequentar eventos religiosos, frequentar noitadas, ficar quase toda a noite, até às três da madrugada, para a "curtição sem fim", ter que tomar uma cerveja a não ser que algum protocolo religioso determine. E, além disso, ouvir a canção popularesca do momento, ser fanático por futebol, e, no caso dos rapazes, aceitar a primeira mulher que lhe der mole.
Essa estranha liberdade é autoritária, um prazer que não é próprio da pessoa, mas uma norma do grupo social que condiciona vantagens para pessoas em situação social emergente. Se, para um rapaz de vida pacata, a mulher desejada não é a "musa do Tchan", ele está sujeito a sérios constrangimentos sociais.
O Brasil está culturalmente doente. A música que faz sucesso é das piores. Os livros mais vendidos são os que fogem de qualquer função de estimular o Saber. A reconstrução do Brasil tenta evitar o uso de sua ferramenta principal, o debate e o questionamento, sob o pretexto de que isso é "reclamar demais das coisas". E o padrão de vida hoje tem que estar sujeito a um clima de alegria tão impositiva que ela se torna até mesmo agressiva.
Ate os concursos públicos apelam para essa toxicidade, à sua maneira, com provas motivadas pela meritocracia, hoje não mais sucumbindo ao exagero de exigir Matemática até para funções ligadas à Comunicação, mas, mesmo assim, criando questões prolixas demais e gabaritos com margens de erro em no máximo seis questões, mas que fazem diferença negativa quanto àqueles que acabam sendo aprovados, justamente quem pouco está querendo trabalhar em cargo público e odeia ter um salário de apenas quatro dígitos.
Trata-se de uma sociedade que tem privilégios sociais profundos, que quer demais na vida, não vê a diferença entre o supérfluo e o essencial, que assina embaixo em injustiças sociais das mais diversas, enquanto exige até para tetraplégicos praticarem decatlo. A "sociedade do amor" surgida com a posse de Lula chega a ser, em certos aspectos, pior do que a sociedade bolsonarista, por pior, abjeta e insuportável que esta seja em verdade.
Isso porque a sociedade burguesa que apoia Lula não quer saber de realidade. A ideia dela é fantasiar, achar que a cultura irá melhorar se o Ministério da Cultura encher de dinheiro na conta de um funkeiro para ele se tornar um artista melhor e musicalmente mais consistente. Esse papo furado, no entanto, só fez com que os funkeiros permaneçam tão medíocres quanto antes e tudo o que eles fizeram com o dinheiro é comprar mansões, carros importados e realizar viagens caríssimas ao exterior.
Tudo é fantasia, com o Brasil sucateado destinado a ser um país desenvolvido apenas por um capricho do pensamento desejoso e dos simulacros de progresso social do governo Lula. Um país com pressa em criar uma cosmética de desenvolvimento - que faz com que a supérflua linha 3 do metrô do Rio de Janeiro seja beneficiada pelo Novo PAC e o VLT o subúrbio ferroviário de Salvador, que facilitaria o deslocamento de trabalhadores, não - , um "país de Primeiro Mundo" para turista ver, não bastasse o papel patético que Lula preferiu fazer ao falar demais nos discursos no exterior.
A burguesia, a classe média abastada que se tornou a base social de apoio a Lula, não gosta de ser altruísta e não quer saber de altruísmo. Apesar de se afirmar "sem preconceitos", é a das mais preconceituosas do mundo. Não admite que um homem adulto, mesmo morando com sua mãe doente, tenha que ficar em casa no sábado.
Constrangido a ter que sair para a noitada e deixado a própria sorte no caminho de volta, pobre rapaz convocado, com imposição militar, ao lazer compulsório das noitadas, não é formalmente proibido a se recusar a tamanho "prazer", mas está sujeito a pagar pelos constrangimentos sociais de ser desprezado e humilhado pelas outras pessoas por conta de "não fazer o que todo mundo faz".
Ate na chamada "sorte grande" os contemplados são pessoas que preferem viver no supérfluo ou mesmo de forma autodestrutiva. Pessoas abastadas preferem torrar dinheiro com cigarros e bebedeira do que ajudar os mais necessitados de verdade. Pessoas dão curtidas quando recebem uma mensagem de um aflito, mas são indispostos a lhe ajudar com algum dinheiro.
Gente que tem contas a pagar e precisa memorar a alimentação e comprar remédios por motivos de saúde perde muito dinheiro, enquanto os que mais ganham dinheiro desperdiçam tempo dedicando um domingo de descanso para se embriagar de muita cerveja e falar somente sobre futebol, esporte que começa a ser visado negativamente por conta de seu fanatismo.
É compreensível que essa sociedade goste tanto do "espiritismo" brasileiro a ponto de vender essa religião, oficialmente, sob a imagem de "religião honesta, racional, moderna e despretensiosa". Nenhuma de tais qualidades existe nesta religião tóxica, abusiva e obscurantista que tem no traiçoeiro Chico Xavier a sua maior personalidade, um homem macabro, desonesto e reacionário, que só se tornou "sábio" pela identificação de sua personalidade ultraconservadora por essa sociedade hipócrita que o apoia.
Esse momento no Brasil está tão terrível que, mesmo sob Lula, o processo de imbecilização cultural que veio desde a ditadura militar e teve seu apogeu sob o governo de Jair Bolsonaro só continuou crescendo. Hoje o Brasil tende a ser "feliz de novo" só na parte de uma sociedade de privilegiados, incluindo uma elite empresarial que toma o controle logístico e financeiro do processo de formação do senso comum.
E ficamos assustados quando essa sociedade, como a gente pode observar no exemplo de subcelebridades, quer dominar o mundo. Quer transformar o Brasil num parque de diversões tóxico, onde não cabe a necessidade de se descansar de uma jornada de trabalho, com os brasileiros todos escravizados pelo hedonismo tóxico da curtição noturna sem fim. Aliás, o que são a classe trabalhadora para essa classe média tataraneta dos escravocrata da Casa Grande?
É muito preocupante isso e Lula me decepcionou por preferir ser refém dessa sociedade hipócrita, dessa sociedade que não gosta de ser altruísta nem aceita críticas, porque tudo que tem que prevalecer são as decisões e pontos de vista de Lula e dessa elite social, supostamente sábios em tudo. É lamentável que essa positividade tóxica tenha vindo, porque não precisamos desse Brasil e dessas elites festivas que estão pouco se lixando com a realidade e o sofrimento dos excluídos. O que esta sociedade quer é festa e consumismo, a aparente solidariedade com os pobres e excluídos é só conversa para boi dormir.
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