
É salutar que pessoas discordem disso ou daquilo, desde que suas ideias se somem a um debate. Mas não é isso que acontece na Internet. Frequentemente pessoas só discordam para "puxar o tapete", geralmente para relativizar tanto uma questão que o debate se torna esvaziado e o problema permanece na mesma coisa.
Temos, na verdade, contestações de internautas que, salvo honrosas exceções, se subtraem a um debate. Os "intelectuais de Internet" estão sempre aí, patrulhando o estabelecido, sempre buscando proteger aquilo que está em evidência ou em moda, em vez de resolver um determinado problema.
Vejo queixas na Internet de pessoas que são assim, que protegem tanto o estabelecido que elas se irritam mais quando alguém busca resolver um problema, porque isso lhes tira a estabilidade de sua rotina e tira a graça de reclamar do problema pelas costas. É sério: se alguém se encoraja a combater um problema, ele passa a ser alvo de humilhação por parte de internautas.
Os "intelectuais de Internet" são aqueles que praticamente agem como se o umbigo e o fígado funcionassem mais como órgãos de raciocínio do que o cérebro. É como se o fígado desse o alarme, o umbigo decidisse por uma reação e o cérebro fosse apenas um sub-órgão submisso aos estímulos do umbigo impulsionados pelo fígado.
Esses internautas são aqueles que, ao lerem um texto que não lhes agrada, não param para pensar. Em vez disso, bolam respostas falsamente intelectuais, escrevem como quem fala grosso e têm mania de dar um verniz intelectual nas suas alegações, como no modelo a seguir:
"É certo que seu texto tem alguns pontos que concordo, mas creio que sua argumentação está toda errada, no conjunto, de forma que o fenômeno estabelecido tem até seus erros, mas deve ter sua validade e sua supremacia inteiramente respeitadas".
Em outras palavras, o "intelectual de Internet" questiona tanto e tanto o questionamento, puxando para trás um debate, que o problema acaba sendo mais defendido do que combatido, porque o cara finge concordar com certos pontos de vista que vai desqualificando, um a um, até reduzir a nada.
Os internautas mais ambiciosos "vomitam" suas letras, palavras, pontos e acentos em arremedos de monografias lançadas nos seus blogs, incluindo referências bibliográficas e tudo. A diarreia vocabular parece mais organizada, no desespero de defender modismos, fenômenos e iniciativas que se revelam equivocados, desvantajosos e até nocivos, mas que devem ser mantidos "só porque estão aí".
DECISÃO DOS "DE CIMA"
O exemplo do Rio de Janeiro mostra que as pessoas só respeitam aquilo que vem "de cima". Foi uma batalha combater os ônibus padronizados, por exemplo. Não fosse a generosidade do falecido engenheiro urbano Fernando MacDowell, que resolveu extinguir a medida como membro da equipe da Prefeitura do Rio de Janeiro (temos que reconhecer essa virtude no governo Marcelo Crivella), os passageiros teriam dor de cabeça para diferir uma empresa de outra, pois, cheios de coisas para fazer, os cidadãos não querem embarcar no ônibus errado e complicar suas rotinas.
A pintura padronizada ainda se torna um apego neurótico e até psicótico em outras cidades, como Niterói - uma cidade-dormitório que anda levando má fama pelo sonambulismo social das pessoas, conformadas com tudo e que se indignam apenas com problemas "pragmáticos" e massificados, depois do "julgamento" do "efeito-manada" - , São Gonçalo, Nova Iguaçu, Teresópolis, Campos dos Goytacazes, Araruama, Barra Mansa e Volta Redonda, entre outras.
Fora isso, temos os irritantes ônibus com pintura de viatura policial de Florianópolis, Recife, Limeira, Goiânia e, agora Belo Horizonte, que agora adotou o "visual caveirão" botando seus ônibus com aspecto de "tropa de choque da polícia". Por que será que essas cidades adotaram o visual de "carro de polícia"? Será porque são redutos bolsonaristas? E na Grande Belo Horizonte, com empresas atuando em diversas cidades, regiões e serviços, que custo de repintura deve ser para uma mesma empresa deslocar um veículo de uma zona para outra?
Temos uma cultura musical tenebrosa, temos uma cultura midiática das mais horríveis do mundo, a tal da bregalização arruinou o Brasil, e, apesar daquela falácia de "vamos pôr fim ao preconceito", criou muito mais preconceito e ajudou a derrubar até o Ministério da Cultura e deixou os verdadeiros artistas sem financiamentos sequer para montar palco para peças teatrais.
Tudo porque mulheres-objetos, subcelebridades de reality shows, funkeiros, duplas "sertanejas" etc comandam o espetáculo. E o medíocre que for mais veterano ainda é visto como "gênio", vejam só! E se contestarmos isso, ganhamos o rótulo de "preconceituosos", apesar dos argumentos mais consistentes e objetivos de nossa reprovação.
Vemos os manifestantes irem às ruas no Chile, no Equador, na Argentina, na Venezuela, na Bolívia, e aqui ninguém se manifesta. Quer dizer, o pessoal prefere reclamar pelas costas, "reclamar" por esporte, por passatempo, mas se revoltam mais quando alguém age e reclama de problemas "menos conhecidos", embora nocivos e prejudiciais à população.
Não se pode ter senso crítico nas redes sociais, porque vira alvo de humilhação e até de ofensas gratuitas. Não se pode ter senso crítico nas teses universitárias, porque soa "opinativo" e "anti-científico". Nunca em outro país as pessoas que exercem o senso crítico e apontam problemas graves são tão alvo de discriminação como ocorre no Brasil.
"ESPIRITISMO" É DETURPADO, SIM
E o "espiritismo" brasileiro? Tem gente que nem sabe que a religião é deturpada, que se afastou, sem medir um pingo de escrúpulos, dos ensinamentos originais de Allan Kardec que, quando muitos, foram apenas distorcidos e interpretados com leviano tendenciosismo, para alimentar as ambições pessoais de dirigentes e "médiuns" (sim, os "médiuns" são ambiciosos, não são essa "Brastemp da humildade" que todos os seus seguidores dizem.
E é claro que os "intelectuais de Internet" se apressam a patrulhar em favor do "espiritismo" brasileiro, através de sua diarreia verbal. Sem medo de cair em contradições - como dizer que "só existe um único espiritismo no mundo, o de Kardec" mas depois dizer que "no Brasil o Espiritismo é bem diferente por conta da religiosidade dos brasileiros - , os "isentões espíritas" dão a sua diarreia verbal através de pontos de vista para lá de duvidosos.
Uns se apressam em se dizer "não-espíritas", só para dar "relevância maior" à sua blindagem, sobretudo em prol de um canastrão da fé como Francisco Cândido Xavier, popularmente conhecido como Chico Xavier. Capricham no malabarismo das palavras, a ponto de não se considerarem "donos da verdade" mas lutam para ter sempre a palavra final, o que dá no mesmo.
As pessoas ficam melindrosas. Acadêmicos como Alexandre Caroli Rocha ficam medrosos em questionar supostas psicografias pela análise textual. Ele, em tese, é especializado em Literatura, tem graduação e pós-graduação nessa área, mas ele parece tratar a "psicografia" como se fosse um problema matemático, como seus amigos da Universidade Federal de Juiz de Fora (principalmente Alexander Moreira-Almeida).
Aí eles deixam os problemas "em aberto". Pouco lhes importa, por exemplo, se o estilo do suposto espírito de Humberto de Campos é diferente do que o escritor expressou em vida. Cria-se um artifício "matemático" para apontar dúvidas nesse questionamento, apelando até para "análise de sílabas" em textos de prosas. O mais irônico é que esses acadêmicos deixam passar a poesia do suposto espírito Olavo Bilac, justamente no que se refere à falha na musicalidade dos versos, que era a caraterística maior que o poeta parnasiano deixou em vida.
Ninguém questiona. Ou, quando muito, surgem os "isentões" que questionam os questionadores, até usando de uma falácia mais objetiva, definida por alguns aspectos:
1) Alegam eles que "é preciso ouvir o outro lado", no caso o deles. Mas é "este outro lado" que prevalece e até monopoliza as narrativas em torno do "espiritismo" brasileiro e, em particular, de Chico Xavier;
2) Eles tentam dizer que "não concordam" e "não acreditam em tudo" relacionado a Chico Xavier. Até aprontam confusão, porque parte deles tem como alvo de suas queixas Emmanuel, considerado "vaca sagrada" do "movimento espírita" em geral;
3) A alegação de alguns "isentões" de que "não professam o espiritismo" é um meio de evitar sectarismo e deixá-los abrigados pelo aparato de objetividade de seus duvidosos argumentos;
4) Seguem a análise risível da comunidade acadêmica, que, como no caso de Moreira-Almeida, definiu a "psicografia" de Chico Xavier como "98% confiável". O problema é saber por que admitem que 2% "não é confiável".
Fica um discurso muito chato, e uma diarreia verbal muito grande. Acreditamos que os "isentões espíritas" nem param para pensar, acham que têm resposta pronta para os questionamentos e se atravem até a lutar com fatos e com a realidade para que seus pontos de vista prevaleçam. Não se acham "donos da verdade", mas se comportam como se fossem seus acionistas majoritários.
Os "isentões" são um tipo de "intelectuais da Internet" ainda mais preocupantes. Chegam mesmo a desqualificar Allan Kardec, porque se acham mais "kardequianos" do que o próprio Codificador. Pedem para que o pedagogo francês, falecido há 150 anos, passe a pensar como os "isentões", esses sim o "primor de objetividade, imparcialidade e compreensão de mundo". E olha que Kardec, em seu tempo, já previa os "monopolizadores do bom senso" que hoje se configuram nos "isentões espíritas".
O Brasil está no caos porque tivemos "intelectuais da Internet" puxando tanto para trás que a eleição presidencial acabou dando vitória a Jair Bolsonaro. Ele é um subproduto desse Brasil dissimulado, ganancioso mas metido a humilde, ignorante mas metido a intelectual, que falseia seus desejos, suas neuroses, seus traumas, seus preconceitos. Bolsonaro é o pesadelo que muitos não assumem - há vários bolsomínions enrustidos escondidos nas esquerdas, gritando "Lula Livre" só por gritar.
Temos gente ultraconservadora que não quer ser assim reconhecida. Daí que nossa direita é justamente a que se recusa a se assumir como tal. E vemos também os "espíritas à esquerda" com suas páginas caricaturais, forçando a barra num mimetismo "esquerdista" que entra em choque com as ideias ultraconservadoras de Chico Xavier, que apoiava até o trabalho exaustivo.
O que devemos ter não é gente querendo justificar as distorções e aberrações do nosso cotidiano. Nós não queremos ver gente inventando realismo para a surrealidade do nosso país. Nós não queremos, da mesma forma, que venham patrulhas do estabelecido defendendo ideias e medidas nefastas só porque elas vêm de pessoas de grande status, como governantes, tecnocratas, empresários do entretenimento etc.
Chega de ônibus padronizados, mulheres-objetos metidas a feministas, gírias impostas pela mídia comercial, e chega de ficar blindando o deturpado "espiritismo" do Brasil, como se essa deturpação fosse maior que a Codificação. Lembremos que Allan Kardec obteve suas descobertas gastando tudo de seu próprio dinheiro, e seu cientificismo não merece ser deixado para trás em prol de "médiuns" que viajam em aviões confortáveis e são blindados por aristocratas e colunistas sociais.
E chega dessa sub-intelectualidade de Internet que escreve sem parar para pensar. Até porque vai chegar um dia que esses "intelectuais" terão que correr contra o tempo para apagar mensagens que eles achavam válidas no momento em que foram escritas, mas que, com o tempo, lhes trarão traumas pela falta de sentido que se revelarão no futuro.
Comentários
Postar um comentário