
O FÍSICO DE HOMICIDAS NÃO TEM PRAZO DE VALIDADE DE 150 ANOS E A NATUREZA ACABA ACELERANDO SEU DESGASTE FÍSICO, PELOS DESCUIDOS À SAÚDE E À EMOÇÃO.
Querendo se manter preso ao quinquênio de 1974 a 1978, indo apenas um pouco além a 1979 ou penetrando de leve a 1980, o Brasil enlouqueceu. Desesperado em reviver a Era Geisel, quando o nosso país tinha uma "democracia sob controle", foi eleito um político insano, Jair Bolsonaro, só porque era associado (e muito mal associado) ao militarismo, e está botando tudo a perder.
As pessoas se acham detentoras de um saber do qual não possuem um centésimo sequer. É comum internautas, desesperados, tentarem argumentar o inargumentável e capricham na retórica intelectual, sem perceber que estão escrevendo asneiras, na paranoia de ficarem sempre com a palavra final.
Há pessoas que se dizem comedidas, mas adotam posturas desmensuradas. Internautas que dizem que "são da paz" mas agridem as pessoas. É por isso mesmo que, nos últimos anos, verificamos gente reacionária, surpreendentemente, em muita gente descolada, aparentemente moderna, divertida, atraente, "tudo de bom". Muitos bolsonaristas estavam escondidos em muita gente bacana, inclusive artistas positivistas de MPB e atletas olímpicos ou de futebol brasileiro.
Estamos convidados a abrir mão de convicções que parecem cláusulas pétreas. O deixar de abrir mão das coisas de maneira errada. Aceitamos que jovens atrizes morram de câncer ou parada cardíaca, mas nos sentimos ofendidos quando se fala que aquele feminicida dos anos 1970 ou 1980 pode morrer de câncer ou infarto, apoiados em sensos moralistas que beiram à síndrome de Estocolmo.
Acreditamos num "alpinismo moral" no qual assassinos em geral, sejam feminicidas ou pistoleiros de aluguel, vão virar personalidades cool aos 80 anos. Tudo bem, se isso for assim, que respeitemos, desejemos sucesso e tudo bem. Mas o problema é que o organismo de um assassino, bombardeado por uma série de pressões emocionais que o atingem como tornados derrubando casas, não tem tempo.
É a Natureza que nos diz que um homicida tem não mais que 40% a 80% de expectativa de vida em relação a uma pessoa comum, inofensiva. Tirar a vida de alguém envolve um prejuízo social irrecuperável e uma produção de sentimentos que alternam entre o orgulho e o trauma, a fúria e a depressão, e fazem o homicida impune estar sujeito a sobressaltos que lhe ferem de morte o coração.
É só observar as notícias dos familiares de feminicidas famosos, preocupados com o seu tabagismo intenso. Ou quando o pistoleiro sai de sua casa, beijando a mulher e o filho, e eles são os que mais ficam apreensivos diante da dúvida de que ele poderá voltar para casa vivo.
Mas o moralismo das pessoas acaba investindo numa compreensão maluca das coisas. Infarto, derrame e AVC acabam sendo "patrimônios" de gente tranquila: figurante de novela, jovem atriz, ator veterano de seriado teen, músico de MPB, ator de teatro de vanguarda e esquisitão do rock nacional. Sem falar que, de uns anos para cá, sociedade e mídia querem que os obituários brasileiros pareçam lista de Prêmio Nobel.
No Brasil, só quem pode morrer é gente fofa ou algo próximo disso. Se morrem homicidas, a imprensa não noticia, oculta os cadáveres nos almoxarifados dos jornais. Daqui a pouco, na era das fake news, homicidas mortos darão "novas entrevistas" e "novas fotos" através de hologramas inseridos sobre sósias ou em montagens faciais do NVidia Hyperrealistic Face Generator.
Enquanto isso, damos a homicidas que fumam muito, se alimentam mal, usam drogas pesadas, são péssimos motoristas e vivem em constante tensão um prazo de validade de 150 anos no seu organismo. Tudo bem que esperemos que eles tenham tempo para se arrependerem e virarem legais, mas eles mesmos não colaboram com isso, criando problemas de saúde e tensões sociais que potencialmente irão abreviar suas vidas. E um organismo normal tem um prazo de validade estimado a 80 anos.
Mas essa maluquice é só um aspecto. Temos a aceitação de literatura fake, quando ela apresenta mensagens agradáveis e não traz ofensa alguma. A carteirada religiosa do maior deturpador do Espiritismo, Francisco Cândido Xavier, conhecido pelos seguidores de Chico Xavier, revela uma trajetória em que um pastichador se torna mais bem sucedido do que seu quase-xará Frank Abagnale Jr., farsante estadunidense retratado em Prenda-me Se For Capaz (Catch Me If You Can).
De farsante, Chico Xavier virou "pacifista" e, de vez em quando, algum deslumbrado lança na Internet uma mensagem dele. Ele é o sintoma desse Brasil preso entre 1974 e 1979, saudoso desses tempos, porque Chico Xavier foi um ídolo religioso que se tornou o Olavo de Carvalho da época, guru da ditadura militar e um pretenso líder ecumênico feito para evitar que o Brasil lute pela redemocratização, mantendo a ditadura sob a desculpa de que o país tinha um "consolador".
Mas se até nossos ídolos cult são dessa época, cantores bregas que fizeram sucesso na segunda metade dos anos 1970, então dá para perceber o quanto pessoas que pareciam normais acabam se enlouquecendo na ânsia desesperada de puxar o ponteiro do relógio para trás, regredir o tempo de maneira mais paranoica, para não dizer psicótica, a ponto de fazer muito "cristão do bem" parecer um tresloucado interno de um hospício
Queremos ver bregas considerados vanguardistas, feminicidas moribundos virando youtubers, farsantes mediúnicos virando pacifistas, sub-oficiais encrenqueiros do Exército assumindo a Presidência da República. Abrimos mão de nossas riquezas, das quais rezamos para serem vendidas o mais rápido possível para companhias estrangeiras, e abraçamos retrocessos trabalhistas e previdenciários que prejudicarão nossas finanças. E ainda queremos ver os obituários de famosos do Wikipedia parecendo a lista do Prêmio Nobel.
E tudo isso partindo de pessoas que se julgam normais e equilibradas, que não medem esforços em argumentar suas convicções pessoais - apesar de seu verniz "racional" sempre ser falho em lógica e bom senso - , na desesperada tentativa de ficarem com a palavra final. Com pessoas assim, o Brasil tornou-se um país muito perigoso para se viver. Estamos num hospício e não sabemos.
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