O que tem em comum o fascismo de Jair Bolsonaro, a ênfase da solteirice feminina no "popular demais", a pistolagem no campo, as balas "perdidas" no Rio de Janeiro e o pavor surreal de uma parcela da sociedade brasileira em ver feminicidas morrerem, ainda mais precocemente?
Simples. Está em andamento, sutilmente, uma espécie de "engenharia social higienista", um processo que nunca é assumido na teoria, mas que se nota em reações insólitas nas redes sociais ou em diversos absurdos que acontecem tanto na mídia do entretenimento quanto na imprensa e na política dominantes.
A ideia da sociedade conservadora é criar um eclético mecanismo de redução da população mestiça e negra, que compõe a maioria esmagadora da população pobre, ou o processo de evitar a reprodutividade de muitas mulheres.
Daí o estranho apego a feminicidas que, por seus impulsos emocionais próprios e seus vícios, contraem doenças ou riscos de acidentes trágicos e, por isso, são muito mais vulneráveis do que se imagina. Mesmo assim, uma parte da sociedade que fica apavorada quando se fala que um feminicida tal está com câncer terminal e que mesmo os mais jovens podem morrer de infarto a qualquer momento.
"Isso é um absurdo, deixem o cara viver em paz!", dizem essas pessoas conservadoras, sem saber que, em muitos casos, os feminicidas são alcoolizados, usuários de cocaína, tabagistas inveterados e péssimos motoristas. Muitos ficam aflitos em ver um feminicida morrer de infarto aos 45 anos, mas se esquecem que as mulheres que eles mataram não raro não chegaram a viver sequer 30 anos de idade.
O que é isso? Num país em que verdadeiros gigantes das realizações humanas, como Alberto Santos Dumont e Mário de Andrade, morreram antes de 55 anos de idade, um feminicida que fumou e "cheirou" feito doido no passado não pode morrer antes dos 90?
O problema não é querer ou não querer que o feminicida morra, o problema é que o organismo dele não é excepcional para estar imune a doenças graves. Esse organismo se apodrece nas mesmas condições do organismo de qualquer um! E as pressões emocionais podem fazer um feminicida impune morrer de infarto a qualquer momento, até mesmo se um rádio de uma loja de eletrodomésticos tocar a música que marcou a vida da namorada que ele matou.
Será porque os feminicidas são "higienistas sociais"? Será que eles contribuem, conforme a visão torta da elite do atraso, para o controle da natalidade, assim dessa forma tão troglodita, exterminando muitas mães ou potenciais futuras mães? Ou porque muitos feminicidas, do tipo conjugal - matam as próprias "companheiras" - , são "justiceiros" de valores morais como a Família e o Casamento?
Vivemos uma sociedade maluca e esse reacionarismo, por mais absurdo que seja, é real. Há manifestações de racismo de gente que assume mesmo essa postura. Há posturas de misoginia e misandria que transformam homens e mulheres em rivais. Há gente querendo exterminar esquerdistas e o medo de ver um feminicida famoso fazer parte do obituário do Wikipedia é proporcional à ânsia de ver um petista morto e sepultado em um cemitério conhecido.
O golpe político de 2016 abriu a Caixa de Pandora dessa elite do atraso, que parece ainda viver nos tempos do Império Romano. Há pessoas defendendo até a redução do salário mínimo, sob a desculpa de que o pobre "precisa aprender a gastar dinheiro". De repente a sordidez foi liberada e duas senhoras foram vistas nas passeatas do "Fora Dilma" exibindo, tranquilas, um cartaz dizendo "Por que não mataram todos (os esquerdistas) em 1964?".
O CASO BOLSONARO
Recentemente, segundo uma nota publicada por Lauro Jardim do jornal O Globo - um jornalista conservador, mas crê-se com um mínimo de honestidade informativa possível - publicou uma nota a respeito da palestra de Jair Bolsonaro num evento promovido pelo banco BTG Pactual.
Citando o confronto entre traficantes, policiais e milicianos na favela da Rocinha, no Rio de Janeiro, Jair disse que, se não fosse cumprida ordem de prisão dos bandidos que controlam a comunidade, iria "metralhar a favela". Foi aplaudido pelos executivos. Mas gerou um mal entendido que "queimou" a imagem do político de extrema-direita.
Recentemente, a assessoria de Imprensa do hoje deputado e também declararo presidenciável esclareceu que Jair não defendeu o extermínio indiscriminado da favela, mas no uso das armas para reprimir marginais que resistissem à voz de prisão. O esclarecimento, convenhamos, foi justo e Jair tem o direito de, numa democracia, emitir comunicados nesse sentido.
O problema, porém, é que os fanáticos seguidores de Jair, nas redes sociais, que raciocinam com o estômago, manifestariam desejo, sim, de jogar uma bomba numa favela. Jair pode não parecer tão fascista como se imagina, embora seja, sim, extremamente conservador e defensor de preconceitos sociais condenáveis, como o machismo. Mesmo assim, a forma de Jair expor suas opiniões, independente de mal entendidos ou não, já é condenável por si mesmo, pelo teor impulsivo e pelo nível catártico e reacionário das mensagens.
Num governo fascista, aliás, se observarmos bem, a atuação de ministros se torna ainda mais enérgica e cruel do que os chefes de Estado. Ministros da Justiça ou chefes de algum departamento de Censura, Defesa ou Cultura parecem ter mais empenho do que o próprio líder, na decisão de medidas punitivas e até exterminadoras. No nazismo, Adolf Hitler foi muito cruel, mas parceiros como Adolf Eichmann, Josef Mengele e Joseph Goebbels foram ainda mais longe nas atrocidades.
Talvez o grande mal esteja em quem aplaude a declaração de Jair, que peca por raciocinar a vida como um militar do Exército que ele foi (ele foi desligado da instituição militar por indisciplina) e como um conservador radical, que, movido pela paixão reacionária, é capaz, mesmo, de se oferecer para invadir a Rocinha e sair por aí metralhando qualquer um. Adeptos podem ser piores do que o próprio líder, que já não é aquele primor de consciência social do outro.
Mas esse é um episódio entre tantos. Em Niterói, panfletos foram espalhados, certa vez, em nome de uma entidade fascista chamada "International Klans". Empresários passam a defender abertamente o trabalho escravo, o fim dos direitos trabalhistas, o fim da Justiça do Trabalho, a liberação dos abusos cometidos pelos patrões contra empregados. Vivemos a era das elites do atraso, conforme lembra o sociólogo Jessé Souza, cujos livros, felizmente, são um expressivo sucesso de vendas.
Racistas se comportando de forma arrogante dizendo que "não conseguem controlar esses impulsos". Feminicidas conjugais se comportando de maneira arrogante no júri alegando que um simples pedido de divórcio das respectivas vítimas foi uma "grave traição". Isso sem falar que há muita gente se enrolando em bandeiras do Brasil como se fossem toalhas de banho que defendem o fim da soberania nacional, querendo ver até a padaria da esquina controlada por uma corporação estrangeira.
E OS "ESPÍRITAS"?
Isso é grave e pode parecer um absurdo. Como também pode parecer um absurdo os "espíritas" apoiarem o golpe político em que se vive desde 2016. Mas uma observação mais apurada pode esclarecer que, sim, esses "absurdos" são muito mais reais do que se imagina.
Os "espíritas" manifestaram apoio à Operação Lava Jato e ao Movimento Brasil Livre, organizações que especialistas sérios em Justiça e Direitos Humanos alertaram serem de perfil bastante reacionário, equiparado a de organizações fascistas. Métodos de operação e bandeiras "sociais" da Lava Jato, como a condução coercitiva para depoimentos e a delação premiada (esta uma prática influenciada pela Máfia) e do MBL, como a defesa da Escola Sem Partido, demonstram isso.
Não fosse isso o bastante, os "espíritas" passaram, durante os anos de 2016 e 2017, a escrever pedindo aos sofredores a aceitação e a conformação das desgraças humanas. Houve quem até dissesse que é inútil o arrependimento dos erros, e que a ideia é mesmo gostar de sofrer desgraças, sob a desculpa de que, na oportunidade "vindoura", as bênçãos "infinitas" começassem a surgir.
Isso era a senha para a defesa do "espiritismo" brasileiro aos retrocessos sociais do governo Michel Temer: fim dos direitos trabalhistas, perda da soberania nacional, degradação das relações de trabalho, queda na qualidade de vida da população etc.
Os "espíritas" também são capazes de justificar holocaustos, através da tese das "tragédias coletivas", o que os críticos desse pretenso espiritismo definem como "gado expiatório": atribuir a multidões sem relações pessoais entre si um destino trágico comum, sob o pretexto de "pagarem" por supostos malefícios causados a outrem em vidas passadas. Essa atribuição, além de remeter sem necessidade a encarnações longínquas, é feita à revelia da Ciência Espírita.
Por isso não é surpresa ver uma figura como Divaldo Franco apoiando a Operação Lava Jato e homenageando João Dória Jr.. A sintonia do "médium" baiano com o momento reacionário em que vivemos tira a sua máscara de "progressista". É bom as esquerdas começarem a investigar os "espíritas", porque em muitos casos eles podem acumular fortunas e tesouros pessoais em nome da "caridade".
Se as esquerdas analisarem as irregularidades "espíritas", desde a vergonhosa apropriação de Francisco Cândido Xavier, o Chico Xavier, do nome de Humberto de Campos, até as viagens e hospedagens de luxo dos "médiuns" e palestrantes para falar para ricos e poderosos em seminários ilustres, verão que entre os "espíritas" há coisas muito piores do que o reacionarismo explícito dos Silas Malafaia, Marco Feliciano e Edir Macedo da vida.
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