Um recente caso de estupro repercutiu em todo o país no último fim de semana, trazendo à tona discussões em torno do retrógrado moralismo religioso, aumentando a complexidade dos acontecimentos recentes, como Jair Bolsonaro realizar o auxílio emergencial no teor reivindicado por seus opositores, e depois do presidente renegar medidas dessa natureza.
Em São Mateus, no interior do Espírito Santo, uma menina de 10 anos foi estuprada pelo próprio tio, e acabou se engravidando dele. Com um corpo em formação, uma gravidez nessa idade é risco certo de morte da gestante, que não iria aguentar uma barriga enorme que "explodiria" no seu organismo.
Com isso, o aborto seria a solução mais urgente, o que é permitido por lei. A Constituição fala em abortos legais, em caso de estupro e ameaça à saúde da gestante. O caso da menina envolve as duas condições. Os pais da menina tiveram que encaminhá-la a um hospital em Recife, diante da impossibilidade de realizar o aborto no território capixaba.
Só que, depois que chegaram ao Centro Integrado de Saúde Amauri de Medeiros (Cisam), na capital pernambucana, a divulgação de dados da menina e do local de realização do aborto, autorizado pela Justiça do Espírito Santo, pela militante fascista Sara Winter (ex-integrante do Fémen, grupo feminino sensacionalista que protestava de topless com mensagens pintadas no corpo), fez com que reacionários e fundamentalistas religiosos chegassem na frente do hospital para impedir o aborto.
A desculpa é que o aborto "fere o direito à vida" e, por isso, a gravidez deveria continuar. O grupo invasor gritava e causava incômodo nos internos, gritando clichês de moralismo religioso e levando tempo até serem expulsos do local e os médicos poderem realizar o aborto, que teria sido bem sucedido, apesar da menina manter para sempre o trauma de ter sido violentada sexualmente por um familiar.
Os grupos conservadores que tentaram invadir o hospital eram ligados a seitas neopentecostais. No entanto, sabemos que a "nata" do "espiritismo" brasileiro também é radicalmente contra o aborto, sob qualquer hipótese, recomendando à vítima de estupro que estabeleça um acordo com o estuprador. Em certos casos, os "espíritas" até preferem que a estuprada e o estuprador se casem, dentro do princípio de "enfrentamento de provas humanas".
Em Rondonópolis (MT), em dezembro de 2016, uma pediatra se recusou a atender uma menina de sete anos que foi estuprada, também, por um tio. A pediatra alegou que a vítima era culpada, por "exercer" no estuprador uma "energia sexual" trazida de "outra encarnação". Processada, a pediatra, que se declarou "espírita", foi condenada a pagar R$ 10 mil por danos morais à família da menina.
Os "espíritas" que são mais politicamente corretos, desses que fogem das próprias sombras, é que, aparentemente, desaprovam o ato dos seguidores de Sara Winter, sendo obrigados, neste caso, a terem que admitir o aborto, por ser a vítima uma criança e por seguir as normas legislativas, dentro da aparente correção que procuram ter os roustauguistas mais enrustidos.
Só que isso não impede o desmérito do moralismo "espírita", tão retrógrado quanto o neopentecostal, mas disfarçado de um verniz "progressista" e "humanista", até para manter o vínculo tendencioso com Allan Kardec. Afinal, a hipocrisia do "espiritismo" brasileiro e seu "roustanguismo com Kardec", busca fugir do cientificismo humanista kardeciano, ao mesmo tempo em que o bajula e só o utiliza de forma tendenciosa, para corroborar posições oportunistas.
Os "espíritas" ainda pensam que se aborta, se suicida e se revolta por pura diversão. Pensam que pessoas que fazem isso o fazem porque gostam. Nada disso. E, além disso, talvez estejam indiferentes ao sofrimento da menina de São Mateus, que continuará traumatizada e viverá assustada, entendendo o mundo masculino como hostil e abusivo. Mas, diante da Teologia do Sofrimento, os "espíritas" acham que os sofredores são "mais felizes". Ficam dizendo para os sofredores que recorrem aos tratamentos "espíritas" que "está tudo bem". Quanta falta de sensibilidade.
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