Nada como um dia após o outro. Numa votação em segundo turno na Câmara dos Deputados para a PEC dos Precatórios, proposta de emenda constitucional que flexibiliza o teto dos gastos públicos que deu em 323 votos a favor e 172 contra, o deputado federal Franco Cartafina, que propôs que o suposto médium Francisco Cândido Xavier fosse incluído entre os "heróis da Pátria", disse "Sim" ao calote que favorecerá outro projeto "filantrópico" de um arrivista, ninguém menos que o presidente Jair Bolsonaro.
A PEC permite liberar R$ 9,1 milhões para a implantação do Auxílio Brasil, projeto populista que visa limpar a imagem decadente de Jair Bolsonaro para 2022. É um forte incentivo para a sua reeleição, o que, pelo jeito, não é uma hipótese descartável, ante a infantilização das esquerdas hoje acusadas de acomodação e desmobilização, além de estarem viciadas com a lacração nas redes sociais.
A PEC dos Precatórios ainda precisa ser aprovada no Senado, em votações de dois turnos, para ser sancionada pelo governo. Mas a adesão dos deputados do Centrão, da direita bolsonarista e da chamada "esquerda fraca" de siglas como PSB e PDT - que no interior do país votam, muitas vezes, com o coronelismo - , dá chances de vitória, para desespero das forças progressistas que já começam a ser apelidadas de "esquerda chapeuzinho-vermelho".
Franco Cartafina é um membro da direita de Uberaba, integrante do PP, o Progressistas, um dos partidos que flertou com Jair Bolsonaro, um "sem-partido" que agora encontrou abrigo em outro partido do baixo-clero direitista, o PL, Partido Liberal. Mas o PP já sinalizou que apoiará Bolsonaro na sua campanha para a reeleição.
Uberaba é um dos redutos ultraconservadores de Minas Gerais, por ser parte do Triângulo Mineiro, que vive o poder dos "coronéis" do gado zebu, força latifundiária que atua na região e em parte de Goiás, onde a região se avizinha e da qual alguns municípios goianos são conurbados a essa área do oeste de Minas Gerais.
O próprio Chico Xavier atuou como inspetor de gado zebu, condizendo sempre com sua subordinação servil ao patronato e aos poderosos. Ele foi um árduo defensor da ditadura militar a ponto de ser homenageado com um evento dentro da Escola Superior de Guerra (notem o nome, "Guerra"). Alguém em sã consciência imaginaria que a ESG iria homenagear, gastando dinheiro e espaço, quem não fosse colaborador do regime ditatorial, ante o radicalismo ideológico reacionário da instituição militar?
Franco Cartafina, que propôs e (infelizmente) conseguiu que seu ídolo "espírita" fosse incluído no Livro de Heróis e Heroínas da Pátria, emporcalhando as páginas do "livro de aço" com a inclusão desse mistificador religioso, não é um deputado de causas progressistas, sendo um representante da Bancada do Boi no Congresso Nacional.
Além de votar a favor da PEC dos Precatórios, medida para salvar o governo Jair Bolsonaro, Cartafina também votou a favor da privatização da Eletrobras. Talvez a seu ver, Cartafina queira que Bolsonaro se torne um "filantropo" como Chico Xavier e que os moradores do interior do país - que perderão a oferta de energia elétrica pública, porque a Eletrobras só investirá em cidades lucráveis - que se contentassem com a "luz" a que se atribui a pessoa e a obra do "médium".
Em todo caso, tudo está inserido num contexto ultraconservador, apesar das esquerdas ainda sofrerem da Síndrome de Estocolmo, ainda tomadas de fascinação obsessiva em relação ao "médium" que mais apoiou a ditadura militar e que, se vivo fosse, seria um bolsonarista dos mais inflexíveis.
Chico Xavier defendeu a precarização do trabalho (que alegava ser um "sacrifício para Deus"), as reduções salariais (sob o pretexto do "desapego à matéria), a submissão aos poderosos, mesmo abusivos (suposta lição de abnegação, fraternidade e misericórdia) e demonizava o senso crítico, a contestação e as queixas, mesmo justas, contra as adversidades da vida. Se, com tudo isso, as esquerdas acham que Chico Xavier é "progressista", elas estão com problemas de discernimento da realidade.
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