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O ADVOGADO LEOPOLDO HEITOR MATOU A SOCIALITE DANA DE TEFFÉ E FALECEU EM 2001 AOS 79 ANOS. MAS SEU CRIME NÃO OCORREU NA DITADURA MILITAR.
Por que a imprensa quase não noticia a tragédia ou as mortes de assassinos? Elas noticiam quando gandulas de futebol de várzea morrem de mal súbito, ou quando recos morrem por problemas causados por treinamentos militares. Mas quando um assassino, geralmente rico, morre de infarto ou câncer, quase não há notícia, a não ser quando o contexto permite.
Comparemos, por exemplo, o caso de dois feminicidas, o advogado Leopoldo Heitor, que provavelmente teria matado e ocultado o cadáver da socialite tcheca Dana de Teffé, em 1961, e o empreiteiro Roberto Lobato, que assassinou a esposa Jô Lobato, em 1971, alegando "legítima defesa da honra".
Leopoldo Heitor faleceu em 2001 e teve seu falecimento creditado até no Wikipedia. Tinha 79 anos. Heitor cometeu seu feminicídio numa época em que Jânio Quadros governava o Brasil, enquanto Lobato praticou seu crime durante a ditadura. Embora a sociedade brasileira tenha sido sempre machista, Heitor não foi blindado pelo ideologismo que dominou a ditadura militar. Lobato, que até agora não teve paradeiro creditado, cometeu seu crime sob a "bandeira" da "defesa da honra".
As únicas informações envolvendo o nome "Roberto Lobato" - espécie de "Raimundo Nonato" do Sul-Sudeste, no qual há muitos homens com esses nomes - envolvem, referente a duas pessoas idosas, possivelmente contemporâneas ao feminicida Roberto Lobato (empreiteiro de Belo Horizonte), o falecimento de uma figura de Bambuí, interior paulista - um Roberto Lobato apelidado de "Bertino", além de um fazendeiro de Pitangui, do interior mineiro, que havia recuperado sua propriedade e não tem relações com o feminicida de 1970.
Não só entre os feminicidas, mas também entre outros homicidas que não sejam de origem pobre ou de explícitos problemas psicológicos que os façam lembrar personagens de filmes de terror, estão entre os que morrem ou apresentam problemas de saúde sob o absoluto silêncio de nossos jornalistas.
Ultimamente, entre os assassinos conhecidos, temos três idosos com históricos de graves problemas de saúde. Darly Alves, mandante da morte do seringueiro Chico Mendes, tem histórico de úlceras graves. Dois feminicidas, Doca Street e Pimenta Neves, apresentam gravíssimos problemas de saúde e estão com idade de morrerem a qualquer momento, respectivamente devido a um histórico de tabagismo intenso, eventual alcoolismo e uso de cocaína e a um histórico de tabagismo regular com overdose de comprimidos e indícios de câncer na próstata, diabetes e falência de órgãos.
Muita gente ainda se choca quando se fala que assassinos também morrem. O problema não é desejar que assassinos morram ou não, se bem que são seus amigos que mais temem por tais tragédias. Tirar a vida de alguém traz pressões tão intensas a quem cometeu assassinato que a última coisa que se pode imaginar é que ele possa chegar inteiro e saudável aos 70 anos.
A indústria das fake news até inventou que Doca Street virou youtuber aos 80 anos. A lógica diz, porém, que são familiares e assessores que o representam nas redes sociais (é muito comum um empresário como Doca ter um ghost writer atuando nas redes sociais), porque ele, a essas alturas do campeonato, não tem forças físicas nem psicológicas para enfrentar haters na Internet.
POR QUE TANTO MEDO?
Todos têm que morrer um dia, por causa do esgotamento natural do corpo físico. Mas o aspecto surreal do medo que as pessoas têm em ver um assassino morrendo revela um sentimento muito confuso, aliado a um moralismo retrógrado que faz essas pessoas presas a ilusões moralistas que oscilam entre uma concepção medieval e arrivista do perdão humano e um certo sentimento revanchista que causa desprezo às vítimas.
É mais fácil falar para uma criança sobre meninos e meninas que falecem de câncer raro em plena infância ou começo da adolescência do que falar para um adulto que feminicidas também podem e, não obstante, ainda em idade relativamente prematura, entre os 44 e os 61 anos de idade.
Imaginemos se, em vez de Marcelo Yuka, músico de O Rappa (curiosamente conhecido pelo verso "Também morre quem atira" inserido na versão de "Hey Joe", antiga música de blues e rock cuja letra original era dirigida a um feminicida), morresse, em circunstâncias semelhantes, o feminicida Marcelo Bauer, que matou a namorada com várias facadas em 1987 e fugiu do país e, nos últimos anos, parece envelhecido em dez anos para alguém com cerca de 55 anos.
NÃO NOTICIAR MORTES DE ASSASSINOS NÃO PREVINE HATERS
A gente fica perguntando, também, se o fato da mídia não noticiar as mortes de assassinos seria um meio de evitar as comemorações dos haters. Isso tem um fundo de verdade, mas o problema é que até o PT tem mais haters do que um único feminicida famoso e, se este morrer e sua morte virar notícia até no Jornal Nacional (Rede Globo), ele irá, sim, aos trend topics do Twitter, mas a festa dos haters nem de longe será comparável à da morte de, por exemplo, Fidel Castro e Hugo Chaves.
Outra desconfiança é que, nesta sociedade revanchista em que vivemos, quando o governo Jair Bolsonaro sai por aí com uma pauta de horror e exclusão e "higienização" social, o fato da mídia evitar noticiar mortes de assassinos não seria um meio de evitar trazer medo a aspirantes a novos homicidas, que o moralismo mais retrógrado define como "justiceiros" e "reguladores" da população, nos níveis de Herodes mandando matar crianças.
Afinal, muitos homicidas "diminuem a população" com seus crimes, e no caso do feminicídio, o apetite herodiano de exterminar bebês já vem antecipado, exterminando "futuras mamães". Daí que, quando um feminicida muito famoso morre, ninguém noticia. Mas aí haverá um problema se, por exemplo, um feminicida famoso sofrer um infarto fulminante na Av. Paulista no no Largo da Carioca durante a tarde e diante de um grande movimento de pessoas. Ninguém irá noticiar?
TRAGÉDIA SELETIVA
A sociedade moralista, machista, patriarcalista, com indignação seletiva e com esta seletividade exercida até na tragédia humana, chega ao ponto de, em função desse vício, ter reações diferentes quando uma mesma tragédia atinge músicos de rock, atores de teatro e feminicidas.
Quando é um músico de rock (sobretudo punk ou heavy) que morre de câncer aos 55 anos, a sociedade moralista comemora, dizendo até que o dito-cujo "já vai tarde". Se é um ator de teatro, sentem triste resignação. Mas se é, por exemplo, um empresário, um magistrado ou um profissional liberal que havia matado a esposa e ficado impune, há um estranho sentimento de desespero, com perguntas do tipo "Mas já?", "Não pode ser..." ou coisa parecida.
Acreditando no alpinismo moral - espécie de versão grosseira e caricata da evolução espiritual combinada com os vícios ainda resistentes de vaidade e egoísmo pessoal que lhe conferem um "arrependimento" feito menos pela consciência profunda dos erros e mais para se livrar de encrencas maiores em sua vida - , essas pessoas chegam mesmo a sentir uma confusão emocional.
O assassino é um "sobre-humano" que não pode morrer? Ele é um "arremedo de Deus" quando decide tirar a vida de outrem? Ele é um higienista social que, ao tirar a vida de mulheres, excluídos sociais e ativistas camponeses ou proletários, estaria "regulando" a população no Brasil? Ou o assassino é uma espécie de "justiceiro" de "bandeiras" moralistas ligadas à religião ou às tradições sociias, como a honra masculina associada à formação da Família pelo casamento ou o direito da propriedade que protege os interesses dos grandes proprietários de terras?
A pessoa que se comporta assim fica cheia de confusão. "Ele morrendo ou não, o que isso tem a ver comigo?", pergunta, com certa irritação, se enrolando diante de declarações posteriores como "Se ele morreu, tá morrido", mas se arrepia de medo quando sabe que algum assassino rico ou socialmente privilegiado havia falecido, principalmente se o óbito ocorreu antes dos 60 anos de idade.
Os moralistas acabam sentindo uma "síndrome de Estocolmo" pelos homicidas. Nos EUA, assassinos já falecidos, como Charles Manson e Ted Bundy acabam se tornando "astros pop" pela glamourização de seus crimes, num contexto cheio de contradições nos quais o assassino de John Lennon, Mark Chapman, está sendo salvo da morte, sem saber, por ter negados vários pedidos de liberdade condicional, porque, fora da cadeia, é provável que o matador do ex-Beatle, ironicamente, fosse assassinado por algum dos vários fãs do músico inglês que querem a cabeça do criminoso.
Daí que há um grande medo da morte dos assassinos, um apego injustificado e doentio. Afinal, no caso de Doca Street e Pimenta Neves, se os dois estão gravemente doentes, não é porque eu ou você assim quisemos, mas porque eles fizeram por onde e a Natureza também cobra seu preço por isso. Doca fumou os mesmos cigarros que mataram um sem-número de famosos da década de 1970 e os moralistas brasileiros ainda se irritam quando se fala que o assassino de Ângela Diniz está no fim da vida, aos 85 anos de idade.
No âmbito da reencarnação, talvez fosse lucro um homicida morrer entre os 44 e 65 anos de idade, talvez até menos. Isso porque não irão prolongar a vida tentando recuperar uma reputação "suja do sangue alheio" e, ao reencarnarem, poderão recomeçar a vida do zero sem os privilégios ou vantagens sociais da encarnação anterior, possibilitando criar novos esforços para possibilitar um progresso social sem a sombra do crime cometido.
O que se tem que fazer é orar, sem ódio, quando homicidas estão perto de morrer. Em muitos casos, eles, por suas pressões emocionais e outros vícios associados - como álcool, cigarro e drogas - , danificam seus organismos de maneira mais grave do que se imagina.
Diz o ditado que o assassino "mata sua vítima à vista e mata ele mesmo a prazo", devido às pressões emocionais violentas que surgem em consequência desse crime bárbaro. Paciência, também morre quem atira (ou esfaqueia, envenena etc).
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