Pular para o conteúdo principal

Chico Xavier, o arrivista que quis ser semi-deus



Há um grande problema no fato de Francisco Cândido Xavier apresentar problemas semiológicos que os semiólogos não têm coragem de identificar. Sua ascensão é um terrível problema de linguagem, ou melhor, um fenômeno de linguagem que, de tão sofisticado e bem sucedido, deixou muitos brasileiros desprevenidos, a ponto dos semiólogos não se encorajarem a questionar de verdade o fenômeno Chico Xavier.

A semiologia brasileira fica devendo analisar, de maneira crítica e sem cair em armadilhas mistificadoras e mitificadoras, esse verdadeiro bombardeio de "bombas semióticas" - a redundância é usada para reforçar o sentido - que atingiu o Brasil e que as pessoas ainda têm medo de questionar, porque as paixões religiosas são tentações bastante traiçoeiras, que escravizam corações e mentes com seus "bombardeios de amor" (perigosos apelos ligados a beleza e à afetividade).

Se o "espiritismo" brasileiro é a religião mais dissimulada do Brasil e a que mais domina as técnicas de manipulação da linguagem e do discurso, a ponto de, ao mesmo tempo, oferecer pautas dignas de causas bolsonaristas mas conseguir seduzir setores das esquerdas brasileiras, Chico Xavier é uma coleção de técnicas ainda mais engenhosas de manipulação, um verdadeiro atentado a "bomba semiótica" que em todo ano é periodicamente disparado, várias vezes, em quaisquer cantos do Brasil.

Aparentemente, desconstruir Chico Xavier é mais complicado do que desvendar a esfinge de Gizé, no Egito. Mas isso se deve mais pelo apego doentio das pessoas à sua simbologia religiosa, como modernos Ulisses que se deixam levar pelo canto-de-sereia de um sujeito que é feio, mas a ele são tendenciosamente associados apelos intensos, mas traiçoeiros, de beleza e afetividade.

ILUSÃO CONSENSUAL

O inconsciente coletivo dos brasileiros mostra o conhecido problema dos semiólogos, que é a realidade interpretada como uma "ilusão consensual", ou seja, uma ilusão na qual seus códigos de expressão e crença são compartilhados pela maior parte de membros de um grupo social.

A perigosa idolatria a Chico Xavier revela uma série de falhas perceptivas e cognitivas que refletem essa ilusão, refletem um simulacro de "realidade" que não tem a ver com a lógica dos fatos, mas com a produção de sentido na qual uma série de falácias e fantasias convive harmoniosamente e são apoiadas por um repertório organizado e verossímil de palavras

O que isso significa? Significa que a lógica e o bom senso foram jogados no lixo. Foram substituídos por "réplicas" de compreensão lógica e respaldadas pelo senso comum que, pela aparente estabilidade de sentido que estabelecem no imaginário coletivo, parecem produzir uma "realidade" que parece conveniente, coerente e sempre justificável.

Não se trata mais de cobrar a patente literária das supostas psicografias que, por mais falsas que sejam, transmitem mensagens religiosas. A mediocrização da sociedade cria condições para que aceitemos coisas duvidosas no âmbito da lógica, desde que elas atendam a necessidades pragmáticas (entendidas como primárias, reducionistas e imediatas).

Por sorte, as pessoas acabam cultuando subcelebridades, canastrões musicais (do nível de Alexandre Pires ou Chitãozinho & Xororó, para não dizer outros piores), literatura analgésica (sobretudo auto-ajuda, mas houve um tempo em que romances de Minecraft e "livros para colorir" invadiram o nosso medíocre mercado literário) e classificamos como "jornalismo investigativo" o entretenimento brucutu dos programas policialescos de TV.

Diante disso, criamos uma "realidade" na qual convivemos com o caos e com a barbaridade, e onde os erros humanos são tão banalizados que cometer atos errados, mesmo os mais graves e danosos, virou algo "tão natural" quanto o nascer e o pôr do Sol. As pessoas vivem na complacência ao erro, aceitando a tragédia cotidiana até ela chegar em suas casas e atingir seus meios sociais.

Tudo virou erro. As declarações dos filhos do presidente Jair Bolsonaro, as decisões desastradas e seus correspondentes recuos dos ministros do ex-capitão, as várias mancadas escritas por internautas nas redes sociais. Até a turbulenta separação de um casal de atores da Rede Globo virou uma avalanche de escândalos que envolveram até um "surubão de Fernando de Noronha (ilha ligada ao Estado de Pernambuco)".

Isso tudo impulsionou até os chamados "isentões espíritas", espécie de "bolsomínions enrustidos" do Espiritismo que disparam mensagens nas redes sociais pregando "imparcialidade" nos debates "espíritas" e "fundamento teórico" nas denúncias apresentadas. Cheios de pose de pretensos "racionalistas", esses "espíritas" que pouco estão ligando para a fidelidade doutrinária do Espiritismo original agora falam que os "médiuns" tem que ser respeitados "dentro de suas imperfeições".

Com os erros banalizados e com escândalos envolvendo nomes como Divaldo Franco e o goiano João Teixeira de Faria, o João de Deus, o primeiro dando comentários reacionários e o outro, cometendo crimes diversos, os "isentões espíritas" tentam surfar no falacioso princípio do "Quem nunca errou na vida?", espécie de "carteirada por baixo" que tenta fazer as pessoas que cometem graves deslizes continuar levando vantagem na sociedade.

"BOMBARDEIO DE AMOR" SEMIÓTICO

Chico Xavier é um dos beneficiados por essa "carteirada por baixo" que legitima a banalização do erro humano. Ele, que é o papa da pós-verdade, reinando mesmo postumamente no seu pontificado de falácias, dentro de seu Catolicismo medieval à paisana a que se rebaixou o Espiritismo no Brasil, ele em si é o porta-mísseis semiológico que lança o love bombing a cada conflito social.

Isso não foi sempre assim. A imagem "purificada" de Chico Xavier tem uns 40 e tantos anos. Antes ele era abordado como uma figura mais pitoresca e seus escândalos tinham grande repercussão. Se ele já tinha sua legião de beatos que acreditam na suposta pureza do "humilde homem", havia gente que se indignava com as espertezas do "médium", vendo nele um farsante explícito, um charlatão.

A imagem de Chico Xavier que hoje se conhece foi construída pela Rede Globo, visando favorecer a ditadura militar, criando no "médium" e seu "exemplo de humanidade" a "cortina de fumaça" para as convulsões sociais vividas na época. Foi aí que a Globo importou o método de Malcolm Muggeridge, o "fabricante de santos", para beneficiar Madre Teresa de Calcutá.

A partir daí, Chico Xavier virou uma "bomba semiótica" a ser disparada como uma forma brasileira do perigoso recurso do love bombing, o "bombardeio de amor", forma traiçoeira de manipulação das mentes humanas, porque carrega fortes, porém falsos, apelos de beleza e afetividade que conseguem dominar fácil as pessoas.

Daí os eventuais textos falando no seu "apelo à paz", na sua pretensa "fraternidade", no seu autoproclamado "símbolo de caridade e paz", tão falso quanto a autoproclamação do parlamentar venezuelano Juan Guaidó como presidente interino daquele país. Um arrivista que quis ser semi-deus, sob o eufemismo de "espírito de luz", teve uma imagem muito bem construída e favorecida por um Brasil cujas pessoas não querem saber de fatos e pouco importam, também, com os erros humanos.

São muitos problemas semióticos envolvendo Chico Xavier, que, mesmo depois de morto tornou-se o símbolo desse Brasil irregular e fantasioso que nunca fez progressos sociais verdadeiros e regrediu calamitosamente. Para piorar, com o Velho Mundo também mostrando seus focos de pós-verdade, o Brasil resolveu mergulhar de vez, com as redes sociais endeusando Chico Xavier, que encontra cadeira cativa nesses redutos de fake news, pós-verdades e outras mentiras e ilusões.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Padre Quevedo: A farsa de Chico Xavier

Esse instigante texto é leitura obrigatória para quem quer saber das artimanhas de um grande deturpador do Espiritismo francês, e que se promoveu através de farsas "mediúnicas" que demonstram uma série de irregularidades. Publicamos aqui em memória ao parapsicólogo Padre Oscar Quevedo, que morreu hoje, aos 89 anos. Para quem é amigo da lógica e do bom senso, lerá este texto até o fim, nem que seja preciso imprimi-lo para lê-lo aos poucos. Mas quem está movido por paixões religiosas e ainda sente fascinação obsessiva por Chico Xavier, vai evitar este texto chorando copiosamente ou mordendo os beiços de raiva. A farsa de Chico Xavier Por Padre Quevedo Francisco Cândido Xavier (1910-2002), mais conhecido como “Chico Xavier”, começou a exercer sistematicamente como “médium” espiritista psicógrafo à idade de 17 anos no Centro Espírita de Pedro Leopoldo, sua cidade natal. # Durante as últimas sete décadas foi sem dúvidas e cada vez mais uma figura muitíssimo famosa. E a

Falsas psicografias de roqueiros: Cazuza

Hoje faz 25 anos que Cazuza faleceu. O ex-vocalista do Barão Vermelho, ícone do Rock Brasil e da MPB verdadeira em geral (não aquela "verdadeira MPB" que lota plateias com facilidade, aparece no Domingão do Faustão e toca nas horrendas FMs "populares" da vida), deixou uma trajetória marcada pela personalidade boêmia e pela poesia simples e fortemente expressiva. E, é claro, como o "espiritismo" é marcado por supostos médiuns que nada têm de intermediários, porque se tornam os centros das atenções e os mais famosos deles, como Chico Xavier e Divaldo Franco, tentaram compensar a mediunidade irregular tentando se passar por pretensos pensadores, eventualmente tentando tirar uma casquinha com os finados do além. E aí, volta e meia os "médiuns" que se acham "donos dos mortos" vêm com mensagens atribuídas a este ou aquele famoso que, por suas irregularidades em relação à natureza pessoal de cada falecido, eles tentam dar uma de bonzinh

Chico Xavier apoiou a ditadura e fez fraudes literárias. E daí?

Vamos parar com o medo e a negação da comparação de Chico Xavier com Jair Bolsonaro. Ambos são produtos de um mesmo inconsciente psicológico conservador, de um mesmo pano de fundo ao mesmo tempo moralista e imoral, e os dois nunca passaram de dois lados de uma mesma moeda. Podem "jair" se acostumando com a comparação entre o "médium cândido" e o "capitão messias". O livro O Médico e o Monstro (Dr. Jekyll & Mr. Hyde) , de Robert Louis Stevenson, explica muito esse aparente contraste, que muitas vezes escapa ao maniqueísmo fácil. É simples dizer que Francisco Cândido Xavier era o símbolo de "amor" e Jair Bolsonaro é o símbolo do "ódio". Mas há episódios de Chico Xavier que são tipicamente Jair Bolsonaro e vice-versa. E Chico Xavier acusando pessoas humildes de terem sido romanos sanguinários, sem a menor fundamentação? E o "bondoso médium" chamando de "bobagem da grossa" a dúvida que amigos de Jair Presente

"Mediunidade" de Chico Xavier não passou de alucinação

  Uma matéria da revista Realidade, de novembro de 1971, dedicada a Francisco Cândido Xavier, mostrava inúmeros pontos duvidosos de sua trajetória "mediúnica", incluindo um trote feito pelo repórter José Hamilton Ribeiro - o mesmo que, ultimamente, faz matérias para o Globo Rural, da Rede Globo - , incluindo uma idosa doente, mas ainda viva, que havia sido dada como "morta" (ela só morreu depois da suposta psicografia e, nem por isso, seu espírito se apressou a mandar mensagem) e um fictício espírito de um paulista. Embora a matéria passasse pano nos projetos assistencialistas de Chico Xavier e alegasse que sua presença era tão agradável que "ninguém queria largar ele", uma menção "positiva" do perigoso processo do "bombardeio de amor" ( love bombing ), a matéria punha em xeque a "mediunidade" dele, e aqui mostramos um texto que enfatiza um exame médico que constatou que esse dom era falso. Os chiquistas alegaram que outros ex

O grande medo de Chico Xavier em ver Lula governando o país

Um bom aviso a ser dado para os esquerdistas que insistem em adorar Francisco Cândido Xavier é que o "médium" teve um enorme pavor em ver Luís Inácio Lula da Silva presidindo o Brasil. É sabido que o "médium" apoiou o rival Fernando Collor de Mello e o recebeu em sua casa. A declaração foi dada por Carlos Baccelli, em citação no artigo do jurista Liberato Póvoas ,  e surpreende a todos ao ver o "médium" adotando uma postura que parecia típica nas declarações da atriz Regina Duarte. Mas quem não se prende à imagem mitificada e fantasiosa do "médium", vigente nos últimos 40 anos com alegações de suposto progressismo e ecumenismo, verá que isso é uma dolorosa verdade. Chico Xavier foi uma das figuras mais conservadoras que existiu no país. Das mais radicais, é bom lembrar muito bem. E isso nenhum pensamento desejoso pode relativizar ou negar tal hipótese, porque tal forma de pensar sempre se sustentará com ideias vagas e devaneios bastante agr

URGENTE! Divaldo Franco NÃO psicografou coisa alguma em toda sua vida!

Estamos diante da grande farsa que se tornou o Espiritismo no Brasil, empastelado pelos deturpadores brasileiros que cometeram traições graves ao trabalhoso legado de Allan Kardec, que suou muito para trazer para o mundo novos conhecimentos que, manipulados por espertos usurpadores, se reduziram a uma bagunça, a um engodo que mistura valores místicos, moralismo conservador e muitas e muitas mentiras e safadezas. É doloroso dizer isso, mas os fatos confirmam. Vemos um falso Humberto de Campos, suposto espírito que "voltou" pelos livros de Francisco Cândido Xavier de forma bem diferente do autor original, mais parecendo um sacerdote medieval metido a evangelista do que um membro da Academia Brasileira de Letras. Poucos conseguem admitir que essa usurpação, que custou um processo judicial que a seletividade de nossa Justiça, que sempre absolve os privilegiados da grana, do poder ou da fé, encerrou na impunidade a Chico Xavier e à FEB, se deu porque o "médium" mi

Carlos Baccelli era obsediado? Faz parte do vale-tudo do "espiritismo" brasileiro

Um episódio que fez o "médium" Carlos Bacelli (ou Carlos Baccelli) se tornar quase uma persona non grata  de setores do "movimento espírita" foi uma fase em que ele, parceiro de Francisco Cândido Xavier na cidade de Uberaba, no Triângulo Mineiro, estava sendo tomado de um processo obsessivo no qual o obrigou a cancelar a referida parceria com o beato medieval de Pedro Leopoldo. Vamos reproduzir aqui um trecho sobre esse rompimento, do blog Questão Espírita , de autoria de Jorge Rizzini, que conta com pontos bastante incoerentes - como acusar Baccelli de trazer ideias contrárias a Allan Kardec, como se Chico Xavier não tivesse feito isso - , mas que, de certa forma, explicam um pouco do porquê desse rompimento: Li com a maior atenção os disparates contidos nas mais recentes obras do médium Carlos A. Bacelli. Os textos, da primeira à última página, são mais uma prova de que ele está com os parafusos mentais desatarraxados. Continua vítima de um processo obsessi

As falsas psicografias

Infelizmente, ninguém conhece o que é mediunidade no Brasil. Para piorar, as pessoas aceitam esse desconhecimento, achando que tudo é verídico porque é misterioso, uma coisa inversa e radicalmente oposta ao que se ocorre na vida cotidiana. Isso é grave, porque, no "espiritismo" feito no Brasil, aceita-se tudo sem verificar. E quando se pede para verificar, há quem finja cumprir os mais rígidos procedimentos para garantir veracidade das supostas mensagens espirituais. Não se exige Inmetro, nem qualquer outro recurso de controle e verificação, e um caso típico da credulidade das pessoas corresponde às chamadas cartas "psicografadas", verdadeiros embustes que só fazem explorar e expor ao público as tristezas que as famílias poderiam viver na privacidade e sob assistência de pessoas com menor interesse oportunista possível. O que se observa é que são pessoas escrevendo, com velocidade "industrial", mensagens apócrifas que têm a mesma caligrafia. São m

Caso João de Deus é apenas a ponta do iceberg de escândalos ainda piores

A FAMIGLIA "ESPÍRITA" UNIDA. Hoje o "médium" e latifundiário João Teixeira de Faria, o João de Deus, se entregou à polícia de Goiás, a pedido do Ministério Público local e da Polícia Civil. Ele é acusado de assediar sexualmente mais de 300 mulheres e de ocultar um patrimônio financeiro que o faz um dos homens mais ricos do Estado. João nega as acusações de assédio, mas provas indicam que eles ocorreram desde 1983. Embora os adeptos do "espiritismo" brasileiro façam o possível para minimizar o caso, ele é, certamente, a ponta do iceberg de escândalos ainda piores que podem acontecer, que farão, entre outras coisas, descobrir as fraudes em torno de atividades supostamente mediúnicas, que, embora com fortes indícios de irregularidades, são oficialmente legitimadas por parecerem "agradáveis" e "edificantes" para o leitor brasileiro médio. O caso João de Deus é apenas o começo, embora ele não tenha sido o único escândalo. Outro

Chico Xavier causou confusão mental em muitos brasileiros

OS DOIS ARRIVISTAS. Por que muitos brasileiros são estupidamente reacionários? Por que há uma forte resignação para aceitar as mortes de grandes gênios da Ciência e das Artes, mas há um medo extremo de ver um feminicida morrer? Por que vários brasileiros passaram a defender o fim de seus próprios direitos? Por que as convicções pessoais prevalecem sobre a busca pela lógica dos fatos? O Brasil tornou-se um país louco, ensandecido, preso em fantasias e delírios moralistas, vulnerável a paixões religiosas e apegado a padrões hierárquicos que nem sempre são funcionais ou eficientes. O país sul-americano virou chacota do resto do mundo, não necessariamente porque o Primeiro Mundo ou outros países não vivem problemas de extrema gravidade, como o terrorismo e a ascensão da extrema-direita, mas porque os brasileiros permitem que ocorram retrocessos de maneira mais servil. Temos sérios problemas que vão desde saber o que realmente queremos para nossa Política e Economia até nossos apego