JOSEPH MCCARTHY E WILSON SIMONAL - UM ESTIMULADOR E UM FALSO ACUSADO DE DEDURISMO, QUE SOFRERAM CONSEQUÊNCIAS NEGATIVAS NA SOCIEDADE.
Infelizmente, começam a surgir, dentro do clima reacionário estimulado pela vitória eleitoral de Jair Bolsonaro, uma onda de dedurismo que começou nas escolas. A patrulha ideológica do movimento Escola Sem Partido deu seu ponto de partida, mas hoje não só as universidades, mas também as repartições de serviço público começam a fazer sua "caça às bruxas".
Não é uma boa ideia sair dedurando supostos comunistas. O calor do momento pode fazer, dos reacionários de ocasião, pessoas triunfantes e eternamente vitoriosas, mas a vida mostra que não é bem assim que acontece. O dedurador do momento será, no futuro, uma pessoa solitária, desprezada e desprezível, que, orgulhosa no seu auge, no seu declínio se transforma num cidadão casmurro e melancólico incapaz de olhar sequer para um operador de caixa durante uma compra no mercado.
A situação de neofascismo no Brasil não é inédita. O clima trazido pelo fenômeno Jair Bolsonaro é, na verdade, uma introdução tardia de experiências prévias e comprovadamente prejudiciais vividas por outros povos, e fartamente alertadas por fontes diversas e confiáveis, não necessariamente de esquerda, sendo muitas dessas fontes, aliás, bastante conservadoras.
A própria ditadura militar brasileira também mostra seus prejuízos, dentro dos mesmos aspectos que hoje tentam ser recuperados pelo governo a ser iniciado após o Reveillon. A experiência repressiva do Comando de Caça aos Comunistas (CCC) é um caso que gerou vergonha nos seus ex-membros, hoje idosos taciturnos, decadentes e até mesmo arrependidos, o que mostra que não só o comunismo, mas também o anticomunismo, é um arroubo de juventude que traz remorsos futuros.
Se bem que o comunismo acabou faz tempo e o que se acusa como supostamente comunista são as mudanças de caráter progressista ocorridas na sociedade nas últimas décadas. Até mesmo causas identitárias, relativas a grupos comportamentais, raciais, sexuais ou étnicos, cuja agenda cultural é tolerada por parte da sociedade conservadora, são acusadas de serem "comunistas" por setores histericamente reacionários no Brasil, movidos por paranoia cega e intolerante.
MCCARTHY E SIMONAL
Para provar o quanto denunciar colegas e amigos sob acusação de suposto comunismo, vamos descrever dois fatos históricos. Um, ocorrido nos EUA, foi a moda do macartismo, trazida pelo senador republicano Joseph McCarthy, conhecido também como Joe McCarthy.
Ele lançou uma campanha para que os estadunidenses denunciassem qualquer cidadão que fosse supostamente associado a atividades comunistas dentro do território dos EUA. McCarthy, senador pelo Estado de Winsconsin, realizava discursos que estimulavam os reacionários a realizar o que se definia como "caça às bruxas", numa alusão à prática medieval promovida pelo poder católico.
Servidores públicos, universitários, celebridades, cientistas, artistas, educadores e outras categorias sociais e profissionais foram denunciados por suposta associação ao comunismo. Mesmo sendo abertamente de esquerda, as acusações dadas a eles eram furiosas e grosseiras. Nessa época, documentários anticomunistas mostravam líderes sindicais caricatos que pareciam um misto de Al Capone com o vilão Pinguim das revistas do Batman.
Chegou-se a criar até mesmo a "Lista Negra de Hollywood", que acusou nomes como Lena Horne, Pete Seeger, Orson Welles, Artie Shaw e Charlie Chaplin de supostas atividades comunistas. A onda macartista começou a decair quando o jornalista Edward Murrow, da rede de televisão CBS, passou a denunciar violações de direitos humanos que contribuíram para a decadência de McCarthy, que, desacreditado, deixou a política, caiu no ostracismo e morreu cedo, doente aos 49 anos incompletos.
Por ironia, o juiz brasileiro Sérgio Moro, "herói" dos reacionários de 2016 e futuro ministro da Justiça do governo Jair Bolsonaro, é apelidado jocosamente pelo filho do escritor espírita (autêntico) Deolindo Amorim, o jornalista Paulo Henrique Amorim, de "judge Murrow". Mas o Murrow que denunciou o macartismo era do plano oposto ao juiz paranaense que virou o ídolo da massa macartista brasileira.
Outro caso bem diferente é o que envolveu o cantor Wilson Simonal. Ele nunca foi dedurador, mas tal imagem foi plantada quando, por discussões envolvendo salários com dois seguranças que trabalhavam na produtora administrada pelo cantor - que estava no auge de sua carreira, na virada dos anos 1960 para os 1970 - , os dois empregados, para se vingar, resolveram inventar um boato.
Nesse boato, os dois teriam recebido ameaça do cantor, e haviam sido informados de que ele estaria com um plano de denunciar artistas e outros famosos que contribuíssem em atos de oposição ao regime militar. Tais informações eram mentirosas, mas foram espalhadas, como as fake news de hoje, como "denúncias verídicas".
Wilson Simonal não tinha o menor envolvimento com ideologias de esquerda nem de direita. Ele era apenas um cantor e queria se divertir com música de qualidade e entretenimento, já que ele também era um carismático apresentador de TV, conhecido pelo seu programa Show em Si... Monal. Ele apenas compôs e gravou uma mensagem humanista chamada "Tributo a Martin Luther King", seguindo a influência de seus ídolos de soul music que gravavam canções em prol dos movimentos negros e pacifistas.
Mesmo assim, a boataria funcionou e Simonal viu sua carreira despencar. Seu filho Wilson Simoninha, hoje cantor, era uma criança que testemunhou o pai no auge e no declínio. O outro filho, o também cantor e produtor Max de Castro, nasceu quando o pai já sofria essa crise em sua carreira. Os dois tiveram que acompanhar o pai afundando no alcoolismo, desacreditado até pelo Pasquim - revista de oposição ao regime militar - , que anos depois adoeceu e, em 2000, morreu com apenas 61 anos de idade.
NÃO SE DEVE BRINCAR COM FOGO
Os tempos são outros e é muito arriscado cometer abusos por excesso de valentia. Assim como ricos gananciosos podem empobrecer e assassinos também morrem - embora a sociedade se assuste com a hipótese de homicidas famosos morrerem de repente, até o patrulhamento que fazem para evitar reportagens e documentários contra eles indica esse risco, sobretudo por infarto - , deduradores também podem cair em profundo descrédito.
Hoje, pelo clima de histeria antipetista, vários reacionários podem se achar triunfantes pelo resto da vida por denunciarem supostos comunistas, acreditando que estão fazendo um serviço de "defesa da pátria, da moralidade, dos valores da família e dos bons costumes". Mas o decorrer do tempo simplesmente não tarda a desfazer tais ilusões, como uma pequena onda que destrói um castelo de areia.
Num primeiro momento, deduradores são aplaudidos e considerados "heróis" de uma suposta moralidade, mas passam-se os anos e isso se comprova prejudicial, e o denunciador de ocasião passa a receber descrédito, ao ser depois visto como intolerante e farsante, pois muitas de suas denúncias se comprovam infundadas e socialmente nocivas.
Dificilmente os deduradores escapam de alguma decadência, passando a viver situações de muita vergonha e constrangimento. Os deduradores acabam perdendo amigos, correm o risco de viverem solitários, e a eles se aguarda um futuro de muita depressão e tristeza, que os fará viverem constantemente cabisbaixos e calados, evitados por uma boa quantidade de pessoas.
Portanto, um conselho para aqueles que, diante do clima bolsonarista, estão animados para sair por aí dedurando "petistas" e "comunistas" dos seus ambientes de trabalho e escola: evitem isso, e contenham seus impulsos reacionários. Evitem para que previnam um futuro de muita depressão e sofrimento diante do desprezo que a sociedade sempre reserva aos dedos-duros do passado, que, após o "fogo-de-palha" do momento, passam a ser vistos como intolerantes insuportáveis.
Comentários
Postar um comentário