Com a crise do governo Jair Bolsonaro e da Operação Lava Jato, quando denúncias do The Intercept mostram Sérgio Moro, Deltan Dallagnol e companhia adotando práticas e opiniões inconvenientes, muitos "espíritas", que apoiaram os "ventos de março de 2016" como se fossem o "começo da regeneração", estão sem explicar sobre a constatação de que eles apoiaram o golpe político nos últimos quatro anos.
Tentam eles dizer que "foi sem querer", que "agiram por precipitação", que "foram enganados por espíritos obsessores" etc. Mas eles publicaram, veicularam, alardearam seu apoio escancarado aos protestos do "Fora Dilma", à Operação Lava Jato, ao governo Michel Temer, à reforma trabalhista, à reforma da Previdência e a ideias análogas à Escola Sem Partido, como se tivessem exata noção e consciência do que fizeram.
Sem autocrítica verdadeira, os "espíritas" agora, apavorados, tentam desmentir tudo o que foi manifesto há quatro anos. Tentam alegar que "não era bem assim", que o apoio que eles deram aos atos e fenômenos políticos de 2016 foi "um erro de impulso" e que agora eles, tão bonzinhos, disseram que "foram enganados". Fácil dizer isso. Mas por que os "espíritas" não verificaram as coisas antes?
Sobre as esquerdas que, sendo "espíritas" ou não, ainda assim prestam intensa consideração a Francisco Cândido Xavier, a coisa piora mais ainda. A associação de Chico Xavier a Jair Bolsonaro lhes machuca o coração, mesmo quando os lemas "Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho" e "Brasil, Acima de Tudo, Deus Acima de Todos" apresentam uma simbologia idêntica.
As esquerdas, não só a "esquerda de botequim", que acha que o "funk" iria trazer a Revolução Bolivariana para os brasileiros, e nem a "esquerda socialite", que acreditava que Waldick Soriano era o Fidel Castro brasileiro, mas a "esquerda de novela da Globo", acreditam que Chico Xavier foi discípulo de Karl Marx e temperaria de pacifismo e religiosidade a Revolução Socialista que "irá acontecer no Brasil, através da Pátria do Evangelho".
Quanta tolice! Quanta asneira! E as esquerdas ficam em silêncio, quando contestadas, dentro do clima de "pensem como quiserem". Não conseguem pronunciar uma frase em português simples, "Chico Xavier me decepcionou", ou uma mais simples ainda, "Chico Xavier me enganou" ou "Me iludi com Chico Xavier". Mais fácil para esse pessoal falar russo fluentemente num piscar de olhos.
Com a crise do governo Jair Bolsonaro, depois que páginas da Internet revelaram que Chico Xavier teria apoiado o ex-capitão em 2018, muitos que se recusam a admitir essa realidade agora cobram perguntando se, depois do "cocô dia sim, dia não" e do "incêndio na Amazônia", o "médium" continuaria a estar associado a Bolsonaro.
Acreditamos que Chico Xavier só se decepcionaria com Jair Bolsonaro em casos muito, muito extremos. Ele não teria aprovado o plano de atentado terrorista, é verdade, mas os rumos da sociedade conservadora brasileira mostram que muita gente boa que também ignorou o militar acabou votando nele, por depositar no hoje presidente da República uma esperança significativa para o Brasil.
Não sejamos tolos em crer que Chico Xavier não está neste contexto. A "esquerda fofa" e suas histéricas "Tábata Amaral" da imprensa esquerdista, tresloucadamente defendendo o "bondoso médium" da "maldosa associação" a Jair Bolsonaro, a ponto de escrever textos com linguagem, pasmem, "bolsomínion", tentam tirar Chico Xavier da maré bolsonarista, mas se um Toquinho com suas canções de amor e até sobre infância feliz foi apoiar Bolsonaro na campanha de 2018, por que não um "médium" que sempre defendeu a "aceitação da desgraça sem queixumes"?
As esquerdas que cortejam Chico Xavier estão em silêncio diante de suas posturas equivocadas. Elas não leram os livros do "médium". Não sabem de suas ideias em favor do trabalho exaustivo, da conformação com o infortúnio e de sua reprovação ao senso crítico. Se as esquerdas sindicais convidarem Chico Xavier para uma reunião sobre greve, o "médium" agiria pior do que qualquer pelego, de tanto apoiar o ponto de vista dos patrões.
Quando o povo brasileiro estava sofrendo dificuldades extremas no auge da ditadura militar, Chico Xavier abandonou os necessitados e foi receber homenagens dos generais opressores, dentro da Escola Superior de Guerra, o "laboratório" do golpe de 1964. Chico defendeu a ditadura militar, fez poema em favor dela (mas creditando, de maneira hipócrita, a um Castro Alves que não está mais aí para reclamar), disse que o AI-5 e a repressão eram "necessários" para combater o "radicalismo dos opositores", esculhambou operários, camponeses e sem-teto em pleno programa de TV.
Chico Xavier fez coisas e declarações reacionárias de forma a fazer qualquer bolsonarista ficar de queixo caído. Nem o mais apaixonado bolsonarista agiria com tanta firmeza e consciência de seus atos. Apesar disso, as esquerdas ficam coçando a cabeça, não aceitam a realidade e, fazendo muxoxo, cruzam os braços e reagem num silêncio discordante: "pensem o que quiserem. O meu Chico Xavier é marxista-leninista-trotskista-guevarista-chavista e fim de papo".
É por isso que nossas esquerdas perdem o protagonismo, acreditando em simbologias culturais de direita. Muitos dos "heróis culturais" das esquerdas foram trazidos pela Rede Globo, pelo SBT, pela Record e por uma Folha de São Paulo em seus surtos anti-petistas. Sob a desculpa de "evitar a polarização", as esquerdas chegam a ficar de mãos dadas com Luciano Huck, pelo respaldo a pautas e ídolos comuns.
RETÓRICAS PERIGOSAS
É claro que a polarização ideológica é ruim, mas devemos ter muito cuidado com o discurso anti-polarização, porque por trás desta retórica temos pessoas oportunistas, geralmente de centro-direita, que tentam domesticar e castrar as esquerdas através de paradigmas e personalidades do centro-direitismo, embaladas por falácias supostamente pacifistas, populares e solidárias.
Devemos desconfiar até mesmo de discursos sobre "fraternidade", que muitas vezes pode servir de eufemismo para "gado humano". As palavras "fraternidade" e "paz" soam muito tentadoras, de tal forma que mesmo a mente venenosa que, com a boca cheia de mel, pronuncia tais expressões, atrai para si um apoio unânime, com um "efeito manada" de pessoas deslumbradas nessa pretensa unanimidade supostamente conciliadora.
São discursos muito perigosos, ainda mais num contexto em que a ideia de "paz e amor" tornou-se privatizada, representada tendenciosamente por Chico Xavier (um ídolo religioso formado aos moldes de Madre Teresa de Calcutá, megera cuja imagem foi adocicada por Malcolm Muggeridge, o que faz com que este, indiretamente, "reinventou" Xavier), um arrivista que agora é creditado, mesmo postumamente, como "dono da verdade", "senhor da paz e do amor" e até "dono do futuro de todos nós", vide a ridícula "profecia da Data-Limite", que se revelou um fiasco.
E olha que Chico Xavier não foi essa bondade toda que falam. Fizeram apenas recortes dos momentos em que ele era simpático e conversava alegremente com algumas de suas testemunhas póstumas. Mas Chico era ranzinza, reacionário doentio, e, além disso, se ascendeu de maneira desonesta, e, garantimos, terrivelmente desonesta.
A SÍNDROME DA "VIDRAÇA QUEBRADA"
Existe uma metáfora, relembrada por Wilson Roberto Vieira Ferreira, do Cinegnose, que é a tática da "vidraça quebrada". Fulano quebra a vidraça de uma casa, foge para não ser pego em flagrante e, quando a "poeira" baixa, volta para a casa atingida para vender um kit antirroubo.
Chico Xavier foi o Frank Abagnale Jr. brasileiro, aquele sujeito que enganou o mundo com suas trapaças, retratado no filme Prenda-Me Se For Capaz (Catch Me If You Can). E isso é muito chocante para quem conhece Chico Xavier apenas pela imagem adocicada trazida pelos programas da Rede Globo de Televisão, que oficialmente correspondem à abordagem que hoje se tem do "médium", ou melhor, do anti-médium brasileiro.
No entanto, é só reforçar a memória, ter coragem para encarar os fatos do passado - sem manipulá-los em prol do pensamento desejoso - e ver o lado oculto de Chico Xavier, que é o de uma das pessoas mais traiçoeiras e desonestas de toda a História do Brasil. Infelizmente a realidade é dura e desagradável, mas a verdade tem que ser dita, por mais que ela traga tristeza e indignação para as pessoas.
Afinal, não custa repetir. A "mediunidade" de Chico Xavier é cheia de obras que apresentam irregularidades muito graves, e que, para desespero de muitos, são confirmadas por provas robustas, argumentos dos mais consistentes e objetivos e constatações arrepiantes.
É verdade que houve até acadêmicos que tentaram brigar contra os fatos e, para proteger a imagem adocicada de Chico Xavier, tentaram desmentir seu direitismo explícito e o caráter fraudulento de suas "psicografias". Nomes como Ronaldo Terra, Alexandre Caroli Rocha, Giancarlo Lucchetti, Jorge Cecílio Daher Jr. e Marcelo Caixeta tentam desmentir o óbvio, através de monografias "melindrosas" cuja roupagem "científica" é caprichada na aparência, mas falha em conteúdo.
Não podemos considerar a menor chance de autenticar ou achar "quase autêntica" uma obra como Parnaso de Além-Túmulo porque não há um contexto que sustente qualquer chance de validade dessa obra. O fato dela ter sido remendada cinco vezes já põe em xeque a chance de validação, porque ninguém pode admitir uma obra que, em tese, se anuncia trazida por benfeitores espirituais, mas que sofre alterações editoriais, ainda mais sucessivas vezes.
Chico Xavier foi um arrivista que escapou de qualquer enrascada. Fez obras literárias e cartas fake, e escapou da Justiça com impunidade. Um sobrinho, Amauri Xavier, ameaçou denunciá-lo, e foi vítima de provável "queima de arquivo". Chico Xavier apoiou fraudes de materialização, se juntou a Otília Diogo, mas escapou de ser considerado cúmplice dos crimes da charlatã. Chico Xavier defendeu a ditadura militar abertamente e escapou de ser consagrado um reacionário, apesar de ser um dos mais entusiasmados ultraconservadores, quase um Olavo de Carvalho mais zen.
As pessoas não conseguem aceitar isso. Se fosse somente a centro-direita que não conseguisse, tudo bem, é um pessoal afinado com as ideias ultraconservadoras de Chico Xavier. Mas ver nas esquerdas essa atitude medrosa de assumir a realidade, não há razão alguma para isso. E preocupa essa postura silenciosa do tipo "pensem o que quiserem", achando que o direitismo de Chico Xavier é uma invenção opinativa de algum ressentido de plantão.
Não, não é! E o pior é que as esquerdas veem no "espiritismo" brasileiro um primor de esquerdismo até quando se limitam a dar roupas velhas e mofadas ou alojamentos para moradores de rua, demonstrações de reles Assistencialismo que qualquer dondoca elitista seria capaz de fazer. Um esquerdista de verdade iria longe, dando emprego e moradia a um desabrigado.
Assim que a sociedade blindou Chico Xavier em seus erros - mesmo os mais graves, ofendendo pessoas pobres vitimadas por incêndio em um circo de Niterói, acusando-as de terem sido "cidadãs romanas sanguinárias", e ofendendo os amigos de Jair Presente, atribuindo seu ceticismo como "bobagem da grossa" - , Chico Xavier, muito provavelmente, blindaria Jair Bolsonaro. Ele certamente teria dito a ele:
"Episódios infelizes procuram desnortear o irmão governante (Jair Bolsonaro) que, conduzido por essas más energias, anda a falar, fazer ou deixar fazer coisas indevidas. Pedimos ao povo brasileiro para orarmos a Deus e ao Nosso Senhor Jesus Cristo em favor do presidente, para ele olhar para os necessitados".
Mesmo quando reprovamos a polarização político-ideológica, não podemos ignorar que haja armadilhas também no discurso anti-polarização, porque tem muito neocon que usa esse discurso para seduzir as forças progressistas. Além disso, os próprios bolsonaristas vieram com a retórica "nem de esquerda, nem de direita" para atrair o apoio popular, e vemos o quanto o Brasil se deu mal com isso.
Portanto, mais do que nunca, é preciso prudência e cautela, e acima de tudo romper com paradigmas que parecem confortáveis e vantajosos, mas que estão deixando as pessoas caírem na perdição, sem ter a menor ideia do abismo onde caíram.
Comentários
Postar um comentário