Pular para o conteúdo principal

"Espíritas" brasileiros querem voltar às bases de...1975!!


A recente crise envolvendo o "espiritismo" brasileiro parece repetir a crise de 40 anos atrás, quando o roustanguismo, corrente que se baseia nas ideias do livro Os Quatro Evangelhos, de Jean-Baptiste Roustaing, atingiu seu ponto mais crítico.

Sabe-se que Roustaing, o sinistro advogado de Bordéus, havia lançado o referido livro originalmente em três volumes em que ele alegava ter usado uma única médium para receber as mensagens dos quatro evangelistas (Marcos, Mateus, Lucas e João) e outras figuras bíblicas.

O livro supostamente "complementava" a obra de Allan Kardec e dele diferia pela ênfase nas ideias religiosas, com uma narrativa que parece imitar a Bíblia e, na prática, trazia uma abordagem do Espiritismo que fugia dos conceitos lógicos do codificador de Lyon.

Roustaing foi "descoberto" no Brasil por alguns dirigentes "espíritas", como Adolfo Bezerra de Menezes, o Dr. Bezerra idolatrado por seus seguidores, e depois de algum tempo ganhou edição brasileira nas mãos de Guillon Ribeiro, o mesmo que "domesticou" os livros de Kardec.

Durante muito tempo a Federação "Espírita" Brasileira preferiu Roustaing a Kardec e, no Estatuto da FEB, a leitura de Os Quatro Evangelhos era considerada obrigatória, algo que permaneceu até mesmo nas diretrizes determinadas pelo Pacto Áureo, em 1949.

Mas mesmo na década de 1940 começava a haver polêmica sobre a obra de Roustaing, por causa de dois pontos: o Jesus "fluídico", que acreditava que Jesus nunca passou de um fantasma materializado, e os "criptógamos carnudos", vermes, plantas e micróbios que seriam reencarnação de humanos infratores.

Isso causou um grande escândalo nos bastidores do "espiritismo", mas seus dirigentes, espertos, já tinham uma carta na manga para contornar qualquer crise. O "coringa" da situação foi um caixeiro de Pedro Leopoldo chamado Francisco Cândido Xavier, um católico fervoroso mas que era visto de forma negativa pelos católicos da região porque falava com o espírito de um padre.

O excêntrico Chico Xavier mantinha contatos com o jesuíta Manuel da Nóbrega, que se tornou o espírito Emmanuel. É o mesmo padre reacionário que conduzia o Catolicismo de sua missão jesuíta de forma enérgica, por vezes habilidosa, por outras bastante grotesca.

Chico Xavier foi designado pela FEB para escrever livros e "abrasileirar" o roustanguismo, sob a ajuda de editores da federação e consultores literários que prestavam serviço à entidade. Chico atribuía aos livros a autoria de personalidades mortas diversas, das quais a única hipótese passível de ser verdade é que Emmanuel teria realmente ditado os livros produzidos até meados dos anos 1960.

Com Chico Xavier, as ideias de Roustaing foram adaptadas na sua essência, tirando apenas os aspectos mais polêmicos. E Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho, que por um tendencioso equívoco atribuiu-se à autoria de Humberto de Campos (a obra destoa do estilo deste falecido escritor), tornou-se uma alternativa ao polêmico Os Quatro Evangelhos.

Mesmo assim, Roustaing era defendido pela cúpula da FEB, pelo fato de que sua obra corresponde à tendência do "espiritismo" brasileiro de assimilar dogmas e ritos da Igreja Católica. Era uma forma de evitar o cientificismo de Allan Kardec, considerado "complicado" e "científico demais" pelo "movimento espírita".

As polêmicas, no entanto, tornaram-se fortes, porque ao longo da trajetória da FEB haviam grupos que reivindicavam as bases doutrinárias kardecianas, a princípio a partir de figuras como Afonso Angeli Torteroli, e depois através de José Herculano Pires, Deolindo Amorim e outros.

Isso causava uma série de brigas e debates que em muitos momentos causavam escândalos e ameaçavam a reputação da federação. Escândalos de prováveis fraudes cometidas por Chico Xavier alimentavam também as polêmicas.

O auge da crise se deu em 1973, quando houve até notícia de uma tradução ainda mais grosseira dos livros de Kardec, que levaria a deturpação às últimas consequências. Chico Xavier deu apoio entusiasmado, mas Herculano Pires denunciou a farsa numa emissora de rádio e, com o escândalo causado, Xavier tentou mudar de opinião.

A supremacia da FEB - que decidia as coisas sem consultar as federações regionais - também agravou a crise, sobretudo pela influência de décadas de Antônio Wantuil de Freitas, presidente da entidade nacional durante anos, e que no começo dos anos 1970, já fora do cargo, estava doente, falecendo em 1974.

Francisco Thiessen e um dos membros da cúpula, Luciano dos Anjos, ainda mantiveram firmes no roustanguismo, até que a pressão de seus opositores se intensificou, principalmente com ampla divulgação na imprensa.

Espertos, Chico Xavier e Divaldo Franco, roustanguistas convictos (embora Divaldo dissesse que "não tivera tempo" para ler Roustaing), vendo o barco afundando, forjaram, em diferentes ocasiões, mensagens do dr. Bezerra de Menezes, antigo dirigente da FEB, alegando que "se arrependeu" de ter apreciado a obra de Roustaing.

Segundo essas mensagens, o suposto Bezerra teria "reconhecido" o valor das bases conceituais de Allan Kardec, embora visse no professor lionês não o cientista que debatia o tema da vida espiritual (como era de fato), mas sua forma estereotipada de pedagogo convertido em líder religioso.

Havia até mesmo o apelo para "kardequizar", que soa como uma corruptela de "catequizar", que era a prática educativa dos jesuítas. Portanto, não era um reconhecimento da atividade intelectual de Kardec, mas uma forma de tentar contornar a crise tirando os anéis roustanguianos para preservarem os dedos da FEB. E as mobilizações em torno do "novo espiritismo" vieram a partir de 1975, após o fim da "Era Wantuil".

E, a partir daí, o "espiritismo" passou a seguir diretrizes que se conhecem hoje. Do roustanguismo entusiasmadamente defendido, restou as diretrizes católicas já adaptadas por Chico Xavier. Por outro lado, a tão alardeada fidelidade a Allan Kardec nunca passou de uma demagogia que toma como base as traduções que, excetuando a de Herculano Pires, deturpam o pensamento do pedagogo francês.

Criou-se então um "espiritismo" que fingia ter recuperado as bases kardecianas, mas que se mantinha firme no seu religiosismo de inspiração católico-medieval. Continuaram as "mentiunidades", falsas mediunidades que têm como objetivo fazer pregação religiosa às custas do uso dos nomes dos mortos. Prosseguiu-se também os valores moralistas e outros próprios do conservadorismo "espírita".

Dessa feita, o fim da "Era Wantuil", com o falecimento do antigo dirigente da FEB e o desgaste de seus herdeiros ideológicos diretos, não significou o abandono completo do roustanguismo. Antes tudo permanecesse na mesma, apenas o nome de Roustaing passou a ser escondido e visto como um "palavrão".

Por outro lado, Allan Kardec passou a ser alvo mais frequente de bajulações e até mesmo de interpretações distorcidas e equivocadas de seu pensamento, e as fraudes feitas sob o manto do Espiritismo continuaram plenas, apenas dentro de uma conduta "mais elegante" e "equilibrada", sempre a abafar irregularidades que, denunciadas, gerariam novos escândalos, como os de hoje.

Daí que os chefes "espíritas" querem reviver 1975, se aproveitando da crise provavelmente para liquidar desafetos sob o pretexto de "praticarem mal o Espiritismo". É, mais uma vez, o momento da cúpula da FEB criar uma "nova limpeza" para assim manter apenas aqueles que são dotados de muito prestígio e poder. Kardec continua tão abandonado quanto antes.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Padre Quevedo: A farsa de Chico Xavier

Esse instigante texto é leitura obrigatória para quem quer saber das artimanhas de um grande deturpador do Espiritismo francês, e que se promoveu através de farsas "mediúnicas" que demonstram uma série de irregularidades. Publicamos aqui em memória ao parapsicólogo Padre Oscar Quevedo, que morreu hoje, aos 89 anos. Para quem é amigo da lógica e do bom senso, lerá este texto até o fim, nem que seja preciso imprimi-lo para lê-lo aos poucos. Mas quem está movido por paixões religiosas e ainda sente fascinação obsessiva por Chico Xavier, vai evitar este texto chorando copiosamente ou mordendo os beiços de raiva. A farsa de Chico Xavier Por Padre Quevedo Francisco Cândido Xavier (1910-2002), mais conhecido como “Chico Xavier”, começou a exercer sistematicamente como “médium” espiritista psicógrafo à idade de 17 anos no Centro Espírita de Pedro Leopoldo, sua cidade natal. # Durante as últimas sete décadas foi sem dúvidas e cada vez mais uma figura muitíssimo famosa. E a

Chico Xavier apoiou a ditadura e fez fraudes literárias. E daí?

Vamos parar com o medo e a negação da comparação de Chico Xavier com Jair Bolsonaro. Ambos são produtos de um mesmo inconsciente psicológico conservador, de um mesmo pano de fundo ao mesmo tempo moralista e imoral, e os dois nunca passaram de dois lados de uma mesma moeda. Podem "jair" se acostumando com a comparação entre o "médium cândido" e o "capitão messias". O livro O Médico e o Monstro (Dr. Jekyll & Mr. Hyde) , de Robert Louis Stevenson, explica muito esse aparente contraste, que muitas vezes escapa ao maniqueísmo fácil. É simples dizer que Francisco Cândido Xavier era o símbolo de "amor" e Jair Bolsonaro é o símbolo do "ódio". Mas há episódios de Chico Xavier que são tipicamente Jair Bolsonaro e vice-versa. E Chico Xavier acusando pessoas humildes de terem sido romanos sanguinários, sem a menor fundamentação? E o "bondoso médium" chamando de "bobagem da grossa" a dúvida que amigos de Jair Presente

Chico Xavier, que abençoou João de Deus, fez assédio moral a Humberto de Campos Filho

HUMBERTO DE CAMPOS FILHO SOFREU ASSÉDIO MORAL DE CHICO XAVIER PARA TENTAR ABAFAR NOVOS PROCESSOS JUDICIAIS. Dizem que nunca Uberaba ficou tão próxima de Abadiânia, embora fossem situadas em Estados diferentes. Na verdade, as duas cidades são relativamente próximas, diferindo apenas na distância que requer cerca de seis horas e meia de viagem. Mas, com o escândalo de João Teixeira de Faria, o João de Deus, até parece que as duas cidades se tornaram vizinhas. Isso porque o "médium" Francisco Cândido Xavier, popularmente conhecido como Chico Xavier, em que pese a sua reputação oficial de "espírito de luz" e pretenso símbolo de amor e bondade humanas, consentiu, ao abençoar João de Deus, com sua trajetória irregular e seus crimes. Se realmente fosse o sábio e o intuitivo que tanto dizem ser, Chico Xavier teria se prevenido e iniciado uma desconfiança em torno de João de Deus, até pressentindo seu caráter leviano. Mas Chico nada o fez e permitiu que se abrisse o c

O grande medo de Chico Xavier em ver Lula governando o país

Um bom aviso a ser dado para os esquerdistas que insistem em adorar Francisco Cândido Xavier é que o "médium" teve um enorme pavor em ver Luís Inácio Lula da Silva presidindo o Brasil. É sabido que o "médium" apoiou o rival Fernando Collor de Mello e o recebeu em sua casa. A declaração foi dada por Carlos Baccelli, em citação no artigo do jurista Liberato Póvoas ,  e surpreende a todos ao ver o "médium" adotando uma postura que parecia típica nas declarações da atriz Regina Duarte. Mas quem não se prende à imagem mitificada e fantasiosa do "médium", vigente nos últimos 40 anos com alegações de suposto progressismo e ecumenismo, verá que isso é uma dolorosa verdade. Chico Xavier foi uma das figuras mais conservadoras que existiu no país. Das mais radicais, é bom lembrar muito bem. E isso nenhum pensamento desejoso pode relativizar ou negar tal hipótese, porque tal forma de pensar sempre se sustentará com ideias vagas e devaneios bastante agr

Falsas psicografias de roqueiros: Cazuza

Hoje faz 25 anos que Cazuza faleceu. O ex-vocalista do Barão Vermelho, ícone do Rock Brasil e da MPB verdadeira em geral (não aquela "verdadeira MPB" que lota plateias com facilidade, aparece no Domingão do Faustão e toca nas horrendas FMs "populares" da vida), deixou uma trajetória marcada pela personalidade boêmia e pela poesia simples e fortemente expressiva. E, é claro, como o "espiritismo" é marcado por supostos médiuns que nada têm de intermediários, porque se tornam os centros das atenções e os mais famosos deles, como Chico Xavier e Divaldo Franco, tentaram compensar a mediunidade irregular tentando se passar por pretensos pensadores, eventualmente tentando tirar uma casquinha com os finados do além. E aí, volta e meia os "médiuns" que se acham "donos dos mortos" vêm com mensagens atribuídas a este ou aquele famoso que, por suas irregularidades em relação à natureza pessoal de cada falecido, eles tentam dar uma de bonzinh

Se Chico Xavier fosse progressista, não haveria a ascensão de Jair Bolsonaro

É um dever questionarmos, até com certa severidade, o mito de Francisco Cândido Xavier. Questionar sem ódio, mas também sem medo, sem relativismos e sem complacências, com o rigor de quem não mede palavras para identificar erros, quando estes são muito graves. Vale lembrar que esse apelo de questionar rigorosamente Chico Xavier não vem de evangélico alucinado nem de qualquer moleque intolerante da Internet - até porque o dito "espiritismo" brasileiro é uma das religiões não só toleradas no país, mas também blindadas pelas classes dominantes que adoram essa "filantropia de fachada" que traz mais adoração ao "médium" do que resultados sociais concretos - , mas da própria obra espírita original. É só ler Erasto, que recomendava rigor no repúdio e no combate aos deturpadores dos ensinamentos espíritas. E mais: ele lembrava que eventualmente os maus espíritos (ou, no contexto brasileiro, os maus médiuns) trazem "coisas boas" (as ditas "mens

Caso João de Deus é apenas a ponta do iceberg de escândalos ainda piores

A FAMIGLIA "ESPÍRITA" UNIDA. Hoje o "médium" e latifundiário João Teixeira de Faria, o João de Deus, se entregou à polícia de Goiás, a pedido do Ministério Público local e da Polícia Civil. Ele é acusado de assediar sexualmente mais de 300 mulheres e de ocultar um patrimônio financeiro que o faz um dos homens mais ricos do Estado. João nega as acusações de assédio, mas provas indicam que eles ocorreram desde 1983. Embora os adeptos do "espiritismo" brasileiro façam o possível para minimizar o caso, ele é, certamente, a ponta do iceberg de escândalos ainda piores que podem acontecer, que farão, entre outras coisas, descobrir as fraudes em torno de atividades supostamente mediúnicas, que, embora com fortes indícios de irregularidades, são oficialmente legitimadas por parecerem "agradáveis" e "edificantes" para o leitor brasileiro médio. O caso João de Deus é apenas o começo, embora ele não tenha sido o único escândalo. Outro

URGENTE! Divaldo Franco NÃO psicografou coisa alguma em toda sua vida!

Estamos diante da grande farsa que se tornou o Espiritismo no Brasil, empastelado pelos deturpadores brasileiros que cometeram traições graves ao trabalhoso legado de Allan Kardec, que suou muito para trazer para o mundo novos conhecimentos que, manipulados por espertos usurpadores, se reduziram a uma bagunça, a um engodo que mistura valores místicos, moralismo conservador e muitas e muitas mentiras e safadezas. É doloroso dizer isso, mas os fatos confirmam. Vemos um falso Humberto de Campos, suposto espírito que "voltou" pelos livros de Francisco Cândido Xavier de forma bem diferente do autor original, mais parecendo um sacerdote medieval metido a evangelista do que um membro da Academia Brasileira de Letras. Poucos conseguem admitir que essa usurpação, que custou um processo judicial que a seletividade de nossa Justiça, que sempre absolve os privilegiados da grana, do poder ou da fé, encerrou na impunidade a Chico Xavier e à FEB, se deu porque o "médium" mi

Chico Xavier e Divaldo Franco NÃO têm importância alguma para o Espiritismo

O desespero reina nas redes sociais, e o apego aos "médiuns" Francisco Cândido Xavier e Divaldo Pereira Franco chega aos níveis de doenças psicológicas graves. Tanto que as pessoas acabam investindo na hipocrisia para manter a crença nos dois deturpadores da causa espírita em níveis que consideram ser "em bons termos". Há várias alegações dos seguidores de Chico Xavier e Divaldo Franco que podemos enumerar, pelo menos as principais delas: 1) Que eles são admirados por "não-espíritas", uma tentativa de evitar algum sectarismo; 2) Que os seguidores admitem que os "médiuns" erram, mas que eles "são importantes" para a divulgação do Espiritismo; 3) Que os seguidores consideram que os "médiuns" são "cheios de imperfeições, mas pelo menos viveram para ajudar o próximo". A emotividade tóxica que representa a adoração a esses supostos médiuns, que em suas práticas simplesmente rasgaram O Livro dos Médiuns  sem um pingo de es

Carlos Baccelli era obsediado? Faz parte do vale-tudo do "espiritismo" brasileiro

Um episódio que fez o "médium" Carlos Bacelli (ou Carlos Baccelli) se tornar quase uma persona non grata  de setores do "movimento espírita" foi uma fase em que ele, parceiro de Francisco Cândido Xavier na cidade de Uberaba, no Triângulo Mineiro, estava sendo tomado de um processo obsessivo no qual o obrigou a cancelar a referida parceria com o beato medieval de Pedro Leopoldo. Vamos reproduzir aqui um trecho sobre esse rompimento, do blog Questão Espírita , de autoria de Jorge Rizzini, que conta com pontos bastante incoerentes - como acusar Baccelli de trazer ideias contrárias a Allan Kardec, como se Chico Xavier não tivesse feito isso - , mas que, de certa forma, explicam um pouco do porquê desse rompimento: Li com a maior atenção os disparates contidos nas mais recentes obras do médium Carlos A. Bacelli. Os textos, da primeira à última página, são mais uma prova de que ele está com os parafusos mentais desatarraxados. Continua vítima de um processo obsessi