Com o caminho aberto para a entrada, praticamente garantida, de Alexandre de Moraes para a vaga de Teori Zavascki no Supremo Tribunal Federal, o Brasil consagra sua mais aberrante fase, em que uma coleção de retrocessos gravíssimos que transformam o país numa nação institucional e politicamente insegura e vulnerável.
Mas o que mais preocupa a todos é a despreocupação daqueles que, meses antes, despejavam fúria descontrolada quando viam Dilma Rousseff ou Lula discursando na televisão, a ponto de baterem panelas de cozinha ou soprarem vuvuzelas em plenas horas noturnas.
São pessoas que vão para as ruas ou praias sorrirem, como se vivessem num paraíso, se reunindo para cantar sobre flores e amores, jogar conversa fora, contar piadas e, nas redes sociais, mostrarem fotos de viagens, selfies com amigos, reencontros com antigos colegas, tudo o mais. Não que isso não deva ser feito, mas da forma como se faz, num momento de catástrofe política em que vivemos, essa alegria mais assusta do que conforta.
Hoje prevalece uma mentalidade que já causou uma tragédia ecológica devastadora, com quase vinte pessoas mortas - animais, então, nem se fala - , que foi a de Mariana, em Minas Gerais, num contexto em que há um plano de privatizações vorazes, em que, se deixarmos, até as creches públicas serão entregues a corporações educacionais dos EUA, venda de nossas riquezas e até entrega de parcelas do território brasileiro para empresas estrangeiras, criando "principados" empresariais gringos aqui.
Que as pessoas possam discordar do PT, de Dilma, de Lula, de José Dirceu e achar que o projeto político deste partido não é de agrado da população, tudo bem. Têm todo o direito de pensar assim. Mas faltou paciência ao aguentar Dilma Rousseff por mais dois anos, perdendo uma boa oportunidade dos opositores "se vingarem" nas urnas em 2018, dando vitória eleitoral a um tucano ou coisa parecida.
Quiseram derrubar as coisas na maior pressa e abriram caminho para um processo de delinquência política que pode trazer defeitos danosos para os brasileiros. E é bom deixar claro que as pessoas que estão felizes hoje também vão pagar a conta, altíssima, dos retrocessos que se acumulam como numa tragicomédia de erros graves.
Até o "folclórico" senhor de idade, que diante das bancas de jornais, ao ver as más notícias na primeira página, ri dizendo que "não tem mais jeito" e volta para casa ou vai ao trabalho tranquilo, vai também pagar a conta. Quando a praia de Copacabana se tornar uma propriedade privada de hotéis de Los Angeles, o pessoal vai perceber.
Se até a cultura popular está privatizada - essa bregalização cultural que certos intelectuais treinados pela mídia patronal para fazer proselitismo nas esquerdas e sabotar os debates culturais - , então a situação está muito, muito feia para o país.
O Brasil virou um país em que uma minoria acha que pode tudo. E isso vem desde aquele valentão das redes sociais, que transforma fóruns de Internet em ringues, cria blogues de ofensas e difamação e depois, despindo de seus fakes truculentos, vai para eventos sociais mostrando seu verdadeiro nome e posando de civilizado, conciliador e antenado.
Chegamos a esse ponto dos abusos humanos de pessoas que julgávamos importantes, gabaritadas e moderadas. Tudo porque apostávamos nossas fichas àqueles a que se presumia alguma superioridade ligada a um atributo material: desde aquele internauta que parecia "o mais divertido" até aquele rico que parecia "responsável" no uso do porte de arma.
Nesse caminho, endeusávamos pessoas por causa do diploma, da fortuna, do poder político, da formação acadêmica, da visibilidade, da fama, e sobretudo do prestígio religioso. As paixões religiosas são justamente as mais perigosas, armadilhas traiçoeiras em que ideias supostamente "puras" ligadas a supostos ideais de simplicidade e humildade revelam sentimentos orgiásticos dos mais cruéis e mais perniciosos e fúteis.
Achávamos que uma coleção de paradigmas de superioridade social iria resolver as crises ocorridas desde 2013. Víamos em políticos conservadores e corruptos pessoas "moderadas" e "responsáveis" para tocar o país na frente. Acreditávamos que sacrifícios traziam mais benefícios do que a obtenção justa dos próprios benefícios.
E o que ganhamos de presente? A perda das nossas riquezas que, vendidas para estrangeiros, não se resultarão no retorno de investimentos sociais e renda socialmente compartilhada pela população, mas em meras migalhas investidas no Brasil, enquanto o grosso do lucro obtido pelas empresas gringas vai para as contas dos paraísos fiscais dos seus donos e de seus aliados mais chegados.
Mas não é só isso. Vamos perder conquistas trabalhistas, trabalhar até morrer, porque a forma como se dará a reforma administrativa só vai garantir os vencimentos da aposentadoria quando o beneficiário já estiver na "pátria espiritual". Se o dinheiro, pelo menos, estiver disponível para seus herdeiros, seria menos mal.
Com a aprovação do repressivo ministro licenciado da Justiça, Alexandre de Moraes, para a vaga do STF, a situação do Brasil ficará ainda pior. Teremos um Judiciário que já conta com pessoas de atuação duvidosa, como Gilmar Mendes. O STF, que monitora a aplicação das leis no Brasil, deixará sua isenção de lado e reafirmará como um órgão do PSDB.
Moraes promete que atuará de forma "independente e imparcial", mas sabemos que isso é conversa para boi dormir. Como é conversa para boi dormir tudo o que o presidente Michel Temer diz, achando que, por exemplo, prorrogar a aposentadoria para o fim da vida será ótimo para a população, assim como restringir investimentos públicos para a Saúde e Educação.
Os ricos ficam mais ricos, mais esnobes, mais sádicos, mais preconceituosos, mais violentos. De repente vivemos a ditadura de elites que acham que podem fazer o que querem. Não controlam seus impulsos, mas acham que podem controlar suas circunstâncias e saírem impunes numa boa. Vivemos uma catástrofe social que deve causar perplexidade em todos. Não é hora de sorrir e caçar borboletas pelas ruas das grandes cidades. A hora é de pararmos para pensar no que está o país hoje.
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