BRASIL DE LULA ESTÁ MAIS AFINADO COM A CLASSE MÉDIA IDENTITÁRIA QUE PASSA A MADRUGADA TOMANDO CERVEJA DO QUE DO TRABALHADOR QUE DORME CEDO PARA A JORNADA DO DIA SEGUINTE.
Algo estranho se percebe depois da entrada do novo mandato do presidente Lula. Os mais favorecidos, atualmente, não são necessariamente o povo pobre, como também a construção do Brasil não se dá com valores novos ou renovados nem na discussão dos maiores problemas brasileiros, acumulados há seis décadas.
Quem se favorece com o Brasil de Lula 3.0 é a classe média identitária, que finge ser pobre caprichando nos trejeitos de turista de mercado municipal, usando bermudões e sandálias de dedo. O Brasil "feliz" está muito mais próximo da classe média que atravessa madrugada adentro tomando cerveja nos bares da moda, rindo alto com as piadas vazias que contam, do que do trabalhador que tem que acordar cedo para mais uma jornada difícil no dia seguinte.
Nunca na história do nosso país vimos a hipocrisia de uma classe média que tenta ocultar seu passado golpista agora com o forçadamente fiel apoio ao Lula, a ponto de não aceitar debates nem questionamentos, mesmo quando Lula realmente está errando.
Seus ancestrais já açoitaram e marcaram a ferro os corpos dos escravos, defenderam o voto de cabresto, derrubaram presidentes progressistas e pediram ditaduras mais enérgicas. Recentemente, não tiveram o menor escrúpulo para abrir caminho para Jair Bolsonaro fazer o que fez para os brasileiros (um desastre de dimensões bíblicas, vale lembrar).
A sociedade que hoje apoia Lula quer dar a impressão de que agora está tudo bem. Essa sociedade sempre fugiu de textos, artigos, livros que manifestarem o senso crítico, essa forma de percepção da realidade que, infelizmente, nem os cursos de pós-graduação das universidades aceitam. Se fosse brasileiro, um intelectual como Umberto Eco nunca passaria, quando muito, de uma suada graduação em Bacharelado ou Licenciatura, sendo boicotado pelo Mestrado e Doutorado, verdadeiras fabricas de flanelas intelectuais, a passar pano nas problemáticas desproblematizadas para virar patrimônio cultural.
Os livros que mais vendem não expressam senso crítico, mas são verdadeiras águas com açúcar disfarçadas dos mais diversos modismos, do cãozinho com nome de roqueiro até o livro para colorir, passando por uma "fauna" de estudantes que viram vampiros, meninas assustadas que se perdem em florestas sombrias, cavaleiros medievais na busca do enigma de qualquer coisa, influencers dublês de escritores com obras escritas por ghostwriters etc. Nas feiras literárias, se vê o quanto a literatura se esforça em ser mais um modismo pop do que um meio de promover o Conhecimento.
Temos uma classe média hipócrita, cheia de dinheiro, que na sua obsessão de fazer acreditar que tudo está bem no Brasil precisa deixar de lado pessoas que raciocinam, se emocionam, questionam, sentem etc. Afinal, não se pode ser humano no Brasil. O que se tem que ser é um animal hedonista, a beber cerveja em bar e evitar ficar em casa nos fins de semana.
O tal do "amor" que essa classe farsante tanto fala é apenas uma oposição formal do ódio bolsonarista. Nada a ver com o verdadeiro amor, pois esse pessoal não está aí para o trabalhador que precisa dormir cedo porque vai pegar um trem lotado na madrugada para não atrasar na chegada ao local de trabalho. O pessoal quer é "bebemorar" o fim do bolsonarismo, com música alta, piadas sem graça e todo mundo rindo alto dessas piadas que, em condições normais, faria um ser humano com um pingo de sensatez ficar sério e inalterado quase feito uma pedra.
O pessoal dessa "sociedade do amor" diz não ter dinheiro para ajudar o próximo, comprar produtos de gente que precisa pagar as contas, depositar em favor de um necessitado. Mas tem dinheiro para viajar para Bariloche, Cancun, Orlando e Paris, tem dinheiro para comprar grandes embalagens de cigarros, para passar toda noite tomando alguma cervejinha.
Essas pessoas não ajudam o próximo, mas são capazes de torrar metade do salário para ir ver futebol nos estádios, enriquecendo ainda mais os bolsos de craques esportivos e dirigentes de clubes, esses os super-ricos que a "sociedade do amor" deixa passar. Aliás, os empresários da cerveja e do futebol (inclui a mídia associada) enriquecem abusivamente às custas desse fanatismo dessas formas parceiras do entretenimento brasileiro, que atinge níveis de paixão puramente tóxica.
No emprego, note-se que a prioridade, descontando algumas exceções, é contratar gente divertida, embora não necessariamente talentosa, pois há a ilusão de que todo trabalho é fácil de fazer e o empregado só precisa interagir com os colegas e criar umas piadas sem graça para todo mundo rir.
E isso é diferente dos concursos públicos, que formam profissionais ranzinzas, com provas malfeitas de questões tão complicadas que os gabaritos sempre apresentam algum erro em pelo menos três questões. Os novos servidores viram ranzinzas por acharem que os salários que ganham não dão para comprar aqueles carrões da moda à vista.
Culturalmente, além da valorização de livros alienantes, essa "sociedade do amor", essa classe média metida a "gente como a gente", gostam de ver filmes e peças de teatro que imitem fórmulas de sucesso nos EUA, sob a desculpa de ser "mais moderno e urbano". Musicalmente, gostam de música popularesca, e não medem escrúpulos para despejar nas suas festas chiques sucessos medonhos de Chitãozinho & Xororó, Odair José, Michael Sullivan, Exaltasamba, É O Tchan e o que vier dos funkeiros do momento.
Esse pessoal que amanhece botando frases do charlatão "espírita" Chico Xavier nas redes sociais e anoitece tomando cerveja em bares acha que vai dominar o mundo. Por isso a nova orientação dessa elite que, pouco tempo atrás, não suportava Dilma Rousseff um minuto no poder. Agora o pessoal inverte as coisas e não quer que Lula seja criticado sequer nos erros mais comprovadamente equivocados.
Lula está desorientado no atual mandato, e creio que ele ficou desnorteado com a Operação Lava Jato que o levou à prisão e o baniu de concorrer à Presidência da República em 2018. A princípio foi legal ele concorrer a um novo mandato, embora ele não precisasse cancelar debates na Record e no SBT, como também não precisava fazer política externa assim que recomeçou a governar.
Querendo fazer todas as coisas ao mesmo tempo, Lula quer que o nosso país alcance o status de país desenvolvido. Isso é uma meta impossível de se atingir. Mas conta isso para a classe média que exerce seu monopólio narrativo nas redes sociais, que um monte de marmanjões e marmanjonas se comportará feito criancinhas malcriadas e boicotar com arrogância os textos que avisam dos problemas sérios que o Brasil enfrenta, pelo menos, desde 1964.
Há até alguns engraçadinhos com aquele bordão "Vamos botar o Brasil no Primeiro Mundo e depois a gente conversa". Eles não prometeram que "vamos eleger Lula e depois a gente discute se a frente ampla funcionou ou não"? Eles primeiro defendem atingir uma meta, prometendo discutir os problemas depois, mas quando a meta é atingida, fogem de qualquer debate, qualquer questionamento.
Daí que é essa sociedade de valores velhos e caquéticos - que mantém os "heróis" da ditadura militar, de Chico Xavier a Gretchen - que sente a obsessão louca de ver o Brasil no Primeiro Mundo. Mas não se trata, em verdade, de uma verdadeira vontade de ver o nosso país como uma nação desenvolvida. O tal "primeiro mundo" é apenas um aparato que inclui garantias para o consumismo pleno da classe média bem de vida, com diversões que vão de passeios de carro até madrugadas de bebedeira, além das festas da laje forjadas em condomínios de luxo e da ritualista audiência de partidas de futebol.
Mas, na verdade, tudo isso é uma ilusão, que só é "realidade" porque a classe média bem de vida sonha junto achando que isso é realidade, quando essa classe apenas persegue o ouro de tolo dos valores velhos que vão da religiosidade medieval do "espiritismo" brasileiro até a diversão brega mais festiva.
O que essa classe média bem de vida quer, com esse papo de "sociedade do amor", é deixar tudo para lá, é continuar mantendo os valores "positivos" mofados que só tiveram sentido no Brasil ditatorial dos anos 1970 e que lutam para continuarem "eternos" nem que, para isso, seja sacrificado o senso crítico, um mal oriundo dos tempos do AI-5 mas que hoje é "ressignificado" como um ato antissocial, o que mostra que é a mesma elite que quer fugir dos problemas que apenas trocou a "mordaça" pelo "amor". E tem gente acreditando que o Brasil virará país desenvolvido com tanto atraso.
Comentários
Postar um comentário