É claro que houve silêncio absoluto no que se diz ao envolvimento de Divaldo Pereira Franco no lançamento oficial da "ração humana" do prefeito de São Paulo, João Dória Jr., um ato deplorável envolvendo um "médium espírita".
O escândalo da "farinata" é talvez o maior envolvendo um"médium" desde o caso Otília Diogo (1963-1970), no qual o "médium" mineiro Francisco Cândido Xavier, o Chico Xavier, parecendo um Aécio Neves da religião, foi inocentado de acusações de cumplicidade, apesar de haver registros com ele acompanhando atento toda a fraude.
No entanto, a mídia tentou abafar o escândalo, e, infelizmente, a imprensa de esquerda seguiu atrás, seduzida pela imagem adocicada de Divaldo Franco, que saiu pela porta dos fundos depois de oferecer seu evento Você e a Paz para o lançamento do estranho composto alimentar. Divaldo nada fez para impedir o lançamento do produto e também não reagiu diante da exibição do seu nome e da marca do evento na camiseta do prefeito paulistano. Logo, tem responsabilidade, sim, pelo caso.
Aí pesquisamos o fórum de mensagens do Blog da Cidadania, uma das poucas páginas de esquerda que se permitiu falar sobre o caso. Um deslumbrado por Divaldo Franco, então, escreveu um comentário bastante ingênuo e complacente sobre isso. Seu nome é Maurício Santos:
"Foi triste ver Divaldo Franco, o maior representante da Doutrina Espírita (sic), premiar Dória, como "Pessoa que se Doa", em seu evento, de caráter internacional, Você e a Paz. Chego a questionar a responsabilidade de uma figura tão formadora de opinião nesse meio praticar esse ato".
O sujeito, certamente, só expressou dúvida, mas, mesmo assim, demonstrou implicitamente que sentia uma esperança de Divaldo ser "inocentado" por ter sido "manipulado por irmãos pouco esclarecidos ou espíritos de má intenção" a apoiar esse estranho alimento. É aquela coisa: "médium", quando erra, é absolvido mesmo tendo culpa. É o inverso do PT, partido de "criminosos sem crime". O "espiritismo" é a religião do "crime sem criminosos".
Eduardo Guimarães, o responsável pelo Blog da Cidadania e filiado ao citado Partido dos Trabalhadores, deu uma resposta sensata ao internauta: "Talvez essa pessoa não mereça a confiança que depositam nela". A pessoa em questão é Divaldo Franco.
Eduardo, também colaborador do Brasil 247 - cujo outro colunista, Ribamar Fonseca, escreveu um texto apoiando Francisco Cândido Xavier, o Chico Xavier - , foi vítima, meses atrás, de condução coercitiva ordenada por Sérgio Moro, através da Operação Lava Jato. Os "espíritas" apoiam o juiz da "República de Curitiba", vendo nele "símbolo de honestidade e combate à corrupção que fere os princípios da fraternidade cristã".
Quanto ao ato de Divaldo Franco, ele deve responder por responsabilidade, sim, por estar lúcido aos 90 anos, aparentemente sem doenças graves e consciente de seus atos e decisões pessoais. Ele permitiu que um estranho alimento fosse lançado, sem agir com firmeza para exigir documentos de exames higiênicos, sanitários, nutricionais e outros critérios técnicos, e ainda por cima homenageou um político retrógrado acusado de maltratar gente pobre e permitir mortes no trânsito através do programa "Acelera São Paulo".
Divaldo Franco é visto como pretensa unanimidade, pelo discurso melífluo que agrada muitas pessoas. A exemplo de Chico Xavier, é visto como "símbolo máximo de amor ao próximo" e tido erroneamente como "progressista", graças ao trabalho de suposto ativismo social na Mansão do Caminho - cujo projeto pedagógico é feito dentro de padrões similares à Escola Sem Partido - e ao pretenso ativismo pacifista através do culto à sua personalidade no Você e a Paz.
Décadas atrás, o insuspeito jornalista José Herculano Pires, o mais fiel tradutor brasileiro da obra espírita original, advertiu sobre a figura do "médium" Divaldo Franco, afirmando ter zelo, prudência e "necessidade de por-me em guarda e evitar que os outros se entreguem de olhos fechados às manobras que infelizmente se desenvolvem através da palavra ilusória desse rapaz". E acrescentou, na carta divulgada a um jornalista, Agnelo Morato:
"Do pouco que lhe revelei acima você deve notar que nada sobrou do médium que se possa aproveitar: conduta negativa como orador, com fingimento e comercialização da palavra, abrindo perigoso precedente em nosso movimento ingênuo e desprevenido; conduta mediúnica perigosa, reduzindo a psicografia a pastiche e plágio – e reduzindo a mediunidade a campo de fraudes e interferências (...); conduta condenável no terreno da caridade, transformando-a em disfarce para a sustentação das posições anteriores, meio de defesa para a sua carreira sombria no meio espírita".
Infelizmente, pela complacência fácil com que sentem os brasileiros, Divaldo Franco cresceu como mito, assim como Chico Xavier. Ambos têm passados sombrios, de fraudes pretensamente mediúnicas e pregações moralistas conservadoras. Apoiados por apelos emotivos muito fortes, como paisagens floridas e crianças sorridentes, e pelas supostas "mensagens de amor e esperança", os dois grandes deturpadores do Espiritismo cresceram e se tornaram semi-deuses.
Isso é terrível e esse crescimento foi dado durante a ditadura militar, para que ativistas sócio-políticos verdadeiros, como o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva, se ascendessem. Daí que a ditadura militar e a mídia hegemônica se empenharam em investir muito dinheiro para a fabricação de consenso para promover os estranhos "médiuns" que deturparam fútil e levianamente o Espiritismo e depois passaram a ser vistos como supostos símbolos de caridade.
Nessa época, não se podia questionar. Ainda na época do AI-5, Chico e Divaldo foram beneficiados pelo silêncio da sociedade, um atingindo o auge de sua popularidade e outro se ascendendo vertiginosamente, como os ídolos religiosos feitos ao sabor da Rede Globo, que pegou emprestado o discurso demagógico de Malcolm Muggeridge para Madre Teresa de Calcutá para ser usado em favor desses dois deturpadores.
Não é à toa que Madre Teresa foi adotada pelos "espíritas". O discurso conservador dela, acusada de usar a Teologia do Sofrimento para maltratar aqueles que ela dizia ajudar, jogando-os em situações sub-humanas, encaixa muito bem no repertório ultraconservador dos "espíritas", que nada estranham ao ver "médiuns" posando ao lado de Aécio Neves, Michel Temer e João Dória Jr. em clima de cumplicidade.
Mas isso só revela a baixa sintonia que os "espíritas" têm ao cenário sócio-político instaurado em 2016, derrubando a imagem de progressista dessa doutrina que traiu o professor Allan Kardec, ele uma figura progressista em seu tempo e identificado com as energias mentais do Iluminismo. Daí a grande divergência do Espiritismo original e seu "filho bastardo" brasileiro: o primeiro se identifica com o Iluminismo, o segundo, com a Idade Média.
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