O "espiritismo" brasileiro se diz amigo da Ciência, defensor do Conhecimento e valorizador da inteligência, do raciocínio e do bom senso. Mas isso é apenas conversa para boi dormir. Por debaixo dos panos, vemos pregações igrejistas aqui e ali e a supremacia da fé "raciocinada", mas em verdade irracional, acaba sempre vencendo dentro da ideologia da doutrina brasileira.
A verdadeira Ciência, ou melhor, as verdadeiras Ciências, se percebermos as diversas correntes do ramo do Conhecimento, sofrem a cruel discriminação dada pelos "espíritas". Eles, com todo o discurso que os coloca como supostos arautos do pensamento científico, só admitem a Ciência quando ela não contraria os mitos e fantasias trazidos pela fé religiosa.
Gabam-se os "espíritas" de sua suposta postura anti-medieval, porque a retórica do "movimento espírita" sempre tenta nos fazer crer que a doutrina brasileira capitaneada pela Federação "Espírita" Brasileira mas também defendida por aparentes "dissidências", se autoproclama "uma nova revelação" que toma como "superados" os pesadelos doutrinários da Idade Média.
No entanto, isso é mais um engano. Sabe-se que o "espiritismo" brasileiro nada tem a ver com Allan Kardec, apesar de toda a bajulação e todas as chorosas juras de fidelidade ao pensador francês, e na verdade se trata de um engodo religioso que combina moralismo católico medieval como práticas hereges ocultistas como a homeopatia dos mascates, a bruxaria e a Astrologia.
Curandeirismo barato, esoterismo ocultista, moralismo religioso, tudo isso faz do "espiritismo" brasileiro não a tão alardeada adaptação local da doutrina de Allan Kardec, mas uma espécie de variação informal do Catolicismo, um Catolicismo sem batina e sem o senta-e-levanta das missas, mas dotado também de suas frescuras manifestas em dogmas e ritos.
Daí que a apreciação da Ciência, da parte do "movimento espírita", tende a ser a mais tendenciosa e seletiva possível. As publicações "espíritas" precisam em algumas páginas mostrar um desfile de intelectuais e cientistas diversos, como Isaac Newton, Galileu Galilei, Albert Schweitzer e tantos outros.
Mas a máscara cai quando vemos três cientistas alvos de profunda discriminação no Brasil e que, por isso, abrem caminho para mentiras cruéis e nada científicas que favorecem os habituais ídolos do "espiritismo" brasileiro.
QUANDO A CIÊNCIA É INJUSTIÇADA
Três cientistas de renome, mas pouco conhecidos no Brasil, nunca foram estudados devidamente e sofrem a discriminação que permitiu as mentiras relacionadas a suas descobertas e atividades, que só servem para atribuir falso pioneirismo aos festejados totens do "movimento espírita".
Um dos casos mais graves é o de Franz Anton Mesmer, médico e cientista que estudava os processos de magnetização entre animais, cujos resultados chamaram a atenção do professor Hippolyte Leon Denizard Rivail, antes dele adotar o codinome Allan Kardec.
Foi a partir de Franz Mesmer que Kardec estabeleceu os métodos de pesquisa que resultaram na Codificação Espírita, um sistema de ideias e procedimentos relacionados às pesquisas sobre vida espiritual e comunicação com espíritos falecidos.
No entanto, no Brasil não há um livro de Mesmer traduzido para nossos leitores. O que se transmite de Mesmer vem de terceiros, o que não pode ser absolutamente confiável, por mais bem intencionado que alguns autores sejam, porque falta a fonte original, falta o pensador pioneiro, falta o ponto de partida de uma linha de conhecimento e pesquisa que aqui chega em segunda mão.
Há o caso do astrônomo estadunidense Percival Lowell, que fundou um observatório espacial no Arizona (que existe até hoje) e que realizou trabalhos de pesquisa sobre vida em Marte, analisando indícios de existência de vida humana, de civilizações adiantadas e de construções de canais fluviais artificiais. E isso ainda no século XIX.
No entanto, Percival Lowell não é conhecido pelos brasileiros. Também não tem trabalhos traduzidos aqui e o máximo que os leigos podem saber é que ele escreveu um livro sobre o Japão, com uma análise antropológica sobre seus hábitos religiosos.
Com essa lacuna, permitiu-se que um radialista, o presidente da Rádio Rio de Janeiro AM, Gerson Simões Monteiro, também colunista do jornal Extra, inventasse a estória de que Francisco Cândido Xavier teria "descoberto" vida em Marte, através de livros de 1935 e 1939.
Beneficiado pela visibilidade e prestígio altos, Gerson Monteiro, com sua "Lei de Gerson espírita", fez com que Chico Xavier fosse festejado como um suposto "pioneiro científico" ao qual se atribuiu cerca de 80 anos da suposta façanha de ter previsto vida em Marte.
O que Gerson fez foi uma grande bobagem. Afinal, bem antes de Chico Xavier nascer, Percival Lowell lançou livros sobre o assunto, com todos os elementos que no Brasil acredita-se serem "pioneiros" em Chico Xavier: civilizações adiantadas, vida humana, construção de canais fluviais.
Lowell criou uma trilogia de livros sobre o assunto, e o último dos três volumes foi publicado em 1908, portanto, dois anos antes de Chico Xavier nascer. O que significa que Chico Xavier não poderia ser pioneiro de jeito algum, porque o assunto da possibilidade de haver vida em Marte era considerado velho mesmo em 1935.
Outro caso é Wolfgang Bargmann, um cientista conhecido praticamente apenas na Alemanha. Até mesmo em países de língua inglesa, como EUA e Reino Unido, pouco conhecem desse cientista alemão, sobretudo nos EUA, que acolheram, no auge do nazi-fascismo, uma boa parcela de intelectuais da chamada Escola de Frankfurt, que passaram a lecionar no país americano.
Bargmann teria sido um dos principais estudiosos da glândula pineal na década de 1940 e, portanto, integrante de um cenário fértil, embora aparentemente pouco produtivo, sobre o assunto. Talvez essa aparência seja discutível, mas o que se sabe é que a glândula pineal, um assunto já antigo, teve pesquisas impulsionadas na mesma década da Segunda Guerra Mundial.
Mas Bargmann, se é pouco conhecido nos EUA, seria portanto bem menos no Brasil. Praticamente ele "não existiu" e essa lacuna fez com que um pesquisadores que se autoproclamam "sérios" supusessem que um fictício personagem como André Luiz teria "descoberto" novas teses sobre glândula pineal através de livros como Mensageiros da Luz, de 1945.
Sem pesquisar as próprias fontes de 1940 - os estudiosos se limitaram a consultar fontes de terceiros, publicadas a partir de 1977 - , os acadêmicos "espíritas" festejaram e alardearam um suposto pioneirisimo de André Luiz em até seis décadas em relação à glândula pineal.
Daí que isso se configurou numa grave situação, como nas outras acima citadas. E mostra o quanto o "espiritismo" brasileiro não está aí para a Ciência, ou para as Ciências, e que sua apreciação ao conhecimento científico é falsa e oportunista. Para os "espíritas", a Ciência pode até ter atuação autônoma, desde que não contrarie os dogmas da "moderna" fé religiosa. Essa é a dura verdade.
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